Direito ao silêncio
Recentemente tive a oportunidade de expressar nesta coluna minha opinião sobre as CPI’s, afirmando naquela ocasião a soberania investigatória do Poder Legislativo, citando o artigo 56, § 4º, da Constituição Estadual, dispositivo legal que confere às Comissões “poderes próprios das autoridades judiciais”, podendo assim requisitar documentos e intimar pessoas para depor, no intuito de esclarecer fato determinado, providências estas que vêm sendo tomadas pelos integrantes da “CPI do Detran”.
Todavia, é preciso lembrar que no momento em que os parlamentares assumem a “toga dos magistrados”, deixando de lado suas atribuições precípuas (legislar), assumindo o papel de juízes, devem também se portar como magistrados, ou seja, têm o dever de respeitar a Constituição, o Código de Processo Penal e todos os demais dispositivos legais incidentes, durante o desenvolvimento dos trabalhos, tomando uma postura “a priori” de imparcialidade, o que para os políticos constitui-se em uma tarefa hercúlea.
É exatamente neste contexto que se insere a polêmica do “direito ao silêncio” perante as Comissões Parlamentares de Inquérito, porquanto várias pessoas que estão sendo intimadas para prestar depoimentos estão providenciando Ordem de “Habeas Corpus”, justamente para garantir o exercício do direito ao silêncio, sem temer qualquer represália por parte dos senhores deputados, inclusive ordem de prisão, o que seria um exagero.
O direito ao silêncio está expressamente previsto na Constituição Federal, no artigo 5º, inc. LXIII, que assegura: “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”. Mesmo que o texto constitucional se refira apenas ao preso, uma interpretação sistemática com os princípios da ampla defesa, da inocência e do devido processo legal, nos indica que este direito se estende a todos os acusados e investigados em geral, e em qualquer procedimento, policial, judicial, ou administrativo, incluindo as CPI’s.
Este direito decorre de um princípio maior que nos ensina que “ninguém pode ser obrigado a se auto-incriminar”, ou seja, ser forçado a produzir prova contra si mesmo, que se acha inserido na Convenção Americana de Direitos Humanos, reconhecida pelo Decreto nº 678, de 06/11/92. Assim, em nosso sistema penal acusatório, resta evidente que o ônus de provar a responsabilidade criminal do acusado incumbe a quem o acusa.
É por esta e outras questões pontuais que os senhores deputados, antes de estranharem as decisões judiciais que limitam sua competência investigatória, deveriam estudar melhor o ordenamento jurídico pátrio, quando pretenderem assumir sua face de juizes. É como diz o gaúcho: “Ovelha não é pra mato!”.