Episódio X de As Crônicas de Aleph - Sergio Agra - Litoralmania ®
Sergio Agra
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Episódio X de As Crônicas de Aleph – Sergio Agra

…MAS ELE NÃO SABIA DE TUDO!

Episódio X de As Crônicas de Aleph

Episódio X de As Crônicas de Aleph - Sergio Agra

 Mágoa que, indiferente, faz viver. 
Névoa que, diferente, em tudo influi.
O exílio nado do que fui sequer
Ilude, fixa, dá, faz ou possui.

Fernando Pessoa

Assim que o avião de Jango decolou de Brasília para Porto Alegre e daí para Montevidéu o Senador Moura Andrade reuniu o Congresso e comunicou que o Presidente da República se ausentara da Capital com provável destino ao exterior. Aos berros ele informou para o plenário atônito e perplexo: — “Declaro vago o cargo de Presidente da República e, na qualidade de presidente do Congresso, dou posse ao sucessor constitucional, o presidente da Câmara, deputado Ranieri Mazzili, e levanto a sessão”. A sessão fora levantada e os parlamentares favoráveis à revolução  se dirigiram a pé, cruzando a Praça dos Três Poderes em plena madrugada, com destino ao Palácio do Planalto, ao qual tiveram acesso pela porta dos fundos. Este, o tempo iria mostrar, não seria o único golpe em Brasília desferido contra o Regime Democrático de Direito. A nova ordem fora garantida com as tropas nas ruas da Capital da República e nas principais cidades do país. Os anos seguintes marcariam de forma indelével a todos os brasileiros, sobretudo a juventude da década de sessenta.

Da vitrola movida a pilhas provinham os ritmos das reuniões dançantes. As festinhas eram regadas a cuba-libre ou simplesmente Coca-Cola. Fumava-se Minister, mascavam-se chicletes e na sala a media luz, ao som das canções românticas de Peppino di Capri e Sergio Endrigo, escutavam-se os suspiros  e adivinhavam-se ardentes afagos e carícias entre os pares bailarinos. A revolução sexual ainda não fora assimilada. Aos rapazes restava,  findos os bailinhos, acorrerem ao sobrado da “Judith” — a conhecida casa da portinhola da luz vermelha —, concorrido serralho da Rua Marechal Floriano; aos menos afortunados ou que não caíssem nas graças da “Liu”, braço-direito da cafetina, o remédio único e imediato para escroto dolorido: trancar-se no banheiro de suas casas.

As matinês dos domingos, quase sempre, eram nos cinemas Marabá, Cacique, Vitória, Imperial e Guarani. Quando Setembro Vier iremos, em Ritmo de Aventura gozar as Férias no Havaí e descobrir Por quem os Sinos Dobram? e avistar do alto do Trapézio que Assim Caminha a Humanidade, mesmo que Os Pássaros” nos atemorizassem, pois “O Sol é Para Todos e Os Inimigos Não Mandam Flores” para Goldfinger, pois O Espião que Veio do Frio, entre Gritos e Sussurros viajaremos para 2001, Uma Odisseia no Espaço”,al di la de la stelle… sob a luminescência de um Candelabro Italiano.

O guru da hora: Jean-Paul Sartre; o apóstolo da grande recusa que anos mais tarde terminaria formando o exército de um homem só: Marcuse. A música brasileira daria uma guinada radical: o Tropicalismo. Fora um movimento de ruptura que sacudiu o ambiente da música popular e da cultura brasileira entre 1967 e 1968. Seus destaques foram Caetano Veloso e Gilberto Gil, além das participações da cantora Gal Costa e de Tom Zé, da banda Mutantes, e do maestro Rogério Duprat. José Carlos Capinan e Torquato Neto completaram o grupo. Os tropicalistas deram um histórico passo à frente no meio musical brasileiro. O teatro fora alvo constante da repressão. Peças como Liberdade, liberdade, de Millôr Fernandes e Flávio Rangel, Papa Highirte, de Oduvaldo Vianna, O abajur lilás, de Plínio Marcos e Roda viva, de Chico Buarque viram centenas e centenas de páginas de seus originais sendo arrancadas pelos censores e refeitas pelos autores para que pudessem subir aos palcos e, finalmente serem encenadas. Não fora diferente com João e Maria nas Trevas, do gaúcho Ronald Radde.

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