La Niña se despede: seca persiste no RS? O tão falado La Niña, fenômeno climático que marcou o último verão gaúcho com calor intenso e seca implacável, chegou ao seu fim, conforme o anúncio da NOAA.
Contudo, a notícia, embora sinalize uma volta à normalidade climática, não garante alívio imediato para os impactos da severa estiagem que assolou o Rio Grande do Sul.
La Niña, caracterizado pelo resfriamento das águas superficiais do Oceano Pacífico, desencadeia alterações significativas nos padrões de vento atmosféricos, exercendo influência direta no clima de diversas regiões globais, incluindo o território gaúcho. Sua atuação está intrinsecamente ligada à ocorrência de períodos de escassez de chuva no estado.
Segundo Murilo Lopes, renomado meteorologista da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), o término do La Niña inaugura um período de neutralidade climática. Com o Pacífico deixando de ser o protagonista, outros fatores de grande escala passam a ditar o ritmo do clima.
Essa mudança de cenário abre a possibilidade para que os regimes de chuva e temperatura se aproximem dos padrões esperados para cada época do ano. “Saímos de um cenário dominado por um personagem central, o La Niña. Agora, os coadjuvantes assumem o palco na influência climática. Isso não significa que teremos precipitações dentro da média histórica, mas o impacto da condição do Oceano Pacífico diminui, e outras oscilações globais de larga escala ganham relevância na nossa região Sul”, explica o especialista.
O que esperar dos próximos meses?
Apesar do fim do La Niña, a professora Eliana Klerig, da Faculdade de Meteorologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), alerta que a tendência de períodos mais secos para os próximos meses ainda persiste. Ela prevê um padrão de chuva mais concentrada, intercalando momentos de volumes significativos com longos períodos sem precipitação.
“O que também exerce forte influência sobre nós é a temperatura da água do Oceano Atlântico Subtropical, nossa costa, e as concentrações de gelo na Antártica. Esses fatores combinados estão favorecendo essa condição de um outono com menor volume de chuvas”, salienta Eliana.
O meteorologista Daniel Caetano, também da UFSM, complementa, informando que os modelos meteorológicos indicam que os acumulados de chuva devem permanecer abaixo da média climatológica. Um dos fatores que contribui para essa previsão é o aquecimento acima do normal da superfície do continente.
“Considerando que as temperaturas nas regiões centrais do Brasil se mantêm elevadas, podemos esperar um período em que grandes massas de ar mais quente cheguem ao Rio Grande do Sul, atuando como um bloqueio para o avanço das frentes frias, que são os principais sistemas responsáveis pelas chuvas na nossa região”, detalha Caetano.
O futuro da estiagem no RS
A meteorologista Eliana Klerig vislumbra uma possível amenização da situação da estiagem com a chegada das temperaturas mais amenas do outono e inverno. Isso ocorre porque o solo tende a permanecer úmido por mais tempo após as chuvas, e a evaporação dos reservatórios se torna mais lenta.
Entretanto, após um verão marcado por um calor sufocante e escassez hídrica, que levou 310 municípios gaúchos a decretarem estado de emergência, os acumulados de chuva previstos podem não ser suficientes para suprir a demanda de diversas áreas, pelo menos em um horizonte de três meses.
Daniel Caetano ressalta que o reabastecimento hídrico pode ser insuficiente, especialmente para a preparação das culturas de verão.
“As regiões Central e Oeste do estado registraram volumes de chuva significativamente abaixo da média. Com a previsão de que esse padrão de precipitação ligeiramente abaixo da média persista, não vislumbramos um reabastecimento significativo do armazenamento de água”, pondera o meteorologista.
Novo La Niña à vista?
Murilo Lopes tranquiliza, afirmando que não há indicação de um novo fenômeno climático como o La Niña entre o outono e o inverno.
“Dentro do nosso cenário de maior confiabilidade nos modelos meteorológicos, tudo indica que, pelo menos até o início da primavera, teremos um cenário de neutralidade. Não há uma tendência de La Niña a curto prazo, tampouco de um El Niño”, enfatiza o especialista.
É crucial salientar que as previsões meteorológicas estão sujeitas a alterações à medida que os dias avançam, devido às oscilações naturais do sistema climático. Um nível de confiança maior nas previsões deve ser considerado conforme a proximidade dos eventos previstos.
Eliana Klerig adverte que, caso os reservatórios não sejam adequadamente reabastecidos durante o outono e inverno, e um novo La Niña se confirme na primavera, o estado pode enfrentar um quadro de estiagem ainda mais grave. Nesse contexto, ela recomenda a implementação de medidas preventivas, como o planejamento de contingência, a construção de reservatórios de água e a adoção de sistemas de irrigação eficientes.