Colunistas

Os imaginados laços de família

(Quando o “desconfiômetro” é convenientemente esquecido)

O tabu que hipocritamente velava e impunha silêncios ao fim de uma relação conjugal ante a falência do casamento, viu erguido – muito mais pela histórica conquista da mulher ao mercado de trabalho, de sua consequente emancipação e igualdade de seus direitos – o véu que encobria a separação do casal: os preconceitos suscitados pela situação de “mulher desquitada”, sobretudo pelo fato de à esposa conceder-se, então, apenas o papel de mãe e/ou dona de casa. Mulher casada trabalhando fora? Nem pensar!

Este era o predominante pensamento machista e dominador até o final dos anos cinquenta do século XX. Assim, o macho, finda a relação e sacramentada ad perpetum nos autos das Varas de Família sua condição de mantenedor, apanhava a mala e a cuia, beijava os filhos e ia refazer a vida. À mulher não lhe faltariam os meios de manter-se a si própria, a casa, educar as crias, seguir a vida e até mesmo, ainda que com maiores óbices, com perspectivas de formar uma nova família.

Mário fora, naquela ocasião, um desses exemplos. Desquitara-se de Isaura Maria, com quem tivera três filhos. Isso feito, ele apanhou apenas suas roupas e foi refazer a vida.

A casa em que Isaura Maria e os filhos permaneceram era vizinha à da sogra e não longe da dos cunhados, de quem ela, Isaura Maria, se outorgou o título vitalício de “membro da família”, com direito a almoços dominicais, festas de aniversários, Natal e Ano Novo. Isaura Maria reinava soberana. Mário – inacreditável! – passou a ser o próprio estranho no “ninho” de Dona Dália, sua mãe, onde, desde então, jamais pudera confraternizar, juntamente com a nova companheira e o filho. Dona Dália sequer pôde conhecer o neto da nova relação de Mário.

Isso – me dirá alguma generosa leitora – só poderia mesmo acontecer no século passado. Fosse hoje, a Isaura Maria “estaria noutra”.

Sim, terá razão a amável leitora. Neste Século XXI, Isaura Maria, realmente, está encarnada noutras “Isauras Marias”.

* Qualquer semelhança com fatos e nomes de pessoas, vivas ou falecidas, é mera coincidência.

Comentários

Comentários