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Quando o tucano se transfigura em carcará

Rafael Ferreira Brito – para quem não o conheceu – nasceu em Capão da Canoa. Até os onze anos viveu como toda a criança e todo pré-adolescente: sugando da vida todas as alegrias e descobertas a ela inerentes. Vitimado por uma moléstia degenerativa que paralisaria gradualmente seus movimentos, viu-se destinado a viver o resto de seus dias sobre uma cadeira de rodas.

Aquilo, no entanto, não o abateu. Prosseguiu nos seus estudos. Curioso, sedento de conhecimento e voraz leitor, os livros não ficavam tão somente sobre a estante. Com todas as limitações que a moléstia o infligiu, Rafael sempre foi um lutador.

Concorreu a vereador, produziu um programa de televisão, “Inclusão em Ação” e, a maior de todas as suas façanhas: criou a Associação dos Portadores de Deficiência de Capão da Canoa, a APODEC, da qual foi seu presidente desde a sua fundação até o momento em que suas frágeis resistências permitiram. Todo o reconhecimento aos cadeirantes e portadores de necessidades especiais, não apenas pelos órgãos municipais, bancos, shoppings, lojas e restaurantes foi fruto do incondicional trabalho de Rafael. E ele veio a falecer em 2010, aos 34 anos.

Transcorrido um ano de sua partida, juntamente com a Mestra e Historiadora, Mariza Simon dos Santos, idealizamos e redigimos uma exposição de motivos, respaldada por quase duas dezenas de assinaturas colhidas, durante o mês de junho, dos munícipes, para que o Vereador Carlos Maia (DEM), que incondicionalmente abraçou nosso projeto, tão logo findo o recesso, o apresentasse, denominando Praça Rafael Ferreira Brito o espaço fronteiro à Casa de Cultura Érico Verissimo, de Capão da Canoa.

O programa “Ponto de Vista”, da Rádio Horizonte, em inúmeras oportunidades, através de seu mediador e apresentador, Giovanni Miraglia, divulgou e tornou pública nossa intenção.

Ingenuamente, por não acreditarmos na existência de ventual falta de ética, na ausência do sentimento de solidariedade e, sobretudo, por não estarmos imbuídos, este colunista e a Professora Mariza, do afã do carreirismo político, dispensamos o documento (exposição de motivos e assinaturas) do registro em Cartório.

Fato divulgado é de domínio público, fazer o quê?

Assim, o Gabinete do Vereador Otávio Teixeira (PSDB), por sua “ágil” assessoria, ingressou, na Sessão Ordinária da terça-feira, dia 2, com projeto protocolado em 29/07/11, cujo teor mostra-se, inusitada e integralmente, coincidente com o de nossa exposição de motivos.

Valeu-nos, a mim e à Mestra Mariza, a famosa passagem do Rei Salomão: Duas mulheres tiveram filhos juntos, um dos filhos morreu e a mãe do que morreu, pegou a da outra mãe. De manhã, ela percebeu que aquele que tinha morrido não era seu filho e começaram a discutir. Foram até o palácio do Rei Salomão e contaram-lhe a história. Ele mandou chamar um dos guardas e lhe ordenou: “Corte o bebê ao meio e dê um pedaço para cada uma”. Falado isso, uma das mães começou a chorar e disse: “Não, eu prefiro ver meu filho nos braços de outra do que morto nos meus”, enquanto a outra disse: “Pra mim é justo”.

Por isso, o que mais nos importa, a mim e à Mariza, agora e sempre, será a perpetuação da memória daquele jovem e exemplar homem. Ela não é apenas nossa. Ela é de toda a comunidade. Nada mais.

* Carcará. – O carcará, por vezes chamado de carancho e gavião caracará, é um falconídeo.. Diferentemente deste, no entanto, não é um predador especializado, e sim um generalista e oportunista alimentando-se de presas fáceis; ataca crias de mamíferos (como filhotes recém-nascidos de ovelhas).

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