A fome, escândalo e vergonha da humanidade – Dom Jaime Pedro Kohl
A Quaresma, para nós cristãos é um tempo para preparar nosso espírito para celebrarmos a Páscoa da Ressurreição. Dizemos ser um tempo de conversão. Tempo para debulhar nossa vida diante do Senhor e limpar a eira para que o grande encontro com o Ressuscitado possa ser vivenciado em modo novo e original, produzindo muitos frutos para o bem de todos.
Logo na introdução do Texto Base da Campanha da Fraternidade deste ano está bem claro que não é uma campanha sobre a Quaresma e seus exercícios de piedade, mas uma ação evangelizadora na Quaresma. Muito importante compreender essa distinção. A Campanha da Fraternidade nada tira ao espirito quaresmal, mas o liberta da tentação individualista e o abre ao eclesial/comunitário. E por que não, também sociotransformador?
Com o tema deste ano, “Fraternidade e Fome” e o lema, “Dai-lhes vós mesmos de comer”, a Igreja Católica no Brasil, pela terceira vez, vem tocar na chaga da fome que atinge o mundo e nosso país, como vimos, há pouco dias, o caso dos nossos irmãos Yanomami. Não podemos fechar os olhos e ficar indiferentes à situação dos 33 milhões de irmãos e irmãs nossos que passam fome. Para um país que está entre os maiores exportadores do mundo em se tratando de grãos e proteína animal, isso é um escândalo, uma vergonha, um grito que sobe aos céus. Isso deve nos inquietar e não podemos pensar que seja normal.
Terminado o carnaval e depostas as máscaras da ilusão, precisamos voltar à realidade nua e crua do trabalho cotidiano, dos compromissos familiares, profissionais e religiosos. É hora de fazer um esforço e ver como podemos colaborar na superação da miséria e da fome de milhões e milhões de crianças, jovens, idosos no Brasil e no mundo.
A Quaresma que iniciamos com a imposição das cinzas lembra nossa fragilidade que precisa ser sustentada pela bondade divina no processo de conversão contínua e comprometimento com a melhoria das condições de vida dos irmãos e irmãs que passam necessidades e não são atendidos em suas necessidades básicas.
Aproveitemos esse tempo favorável, para aproximar-nos mais de Deus que nos conduz aos irmãos. E aproximemos com o coração aberto e desarmado os irmãos que encontraremos o Deus verdadeiro.
A Igreja sabe que cabe ao Estado com suas políticas públicas promover uma sociedade mais justa e solidária. Mas tem consciência de ser uma das forças vivas que pode ajudar nessa construção. E o faz com propostas concretas, a partir da Palavra de Deus e do Mistério celebrado na Liturgia, convidando à conversão pessoal e comunitária, trabalhando incansavelmente na conscientização dos seus fiéis e de todas as pessoas de boa vontade.
Para nossos grupos eclesiais, os subsídios para os encontros de grupo já se encontram nas secretarias paroquiais. É uma forma simples e eficaz para a vivência quaresmal e um modo para “criar vergonha na cara” pela nossa falta de humanidade.
Para refletir: Como vejo a questão da fome no Brasil e no mundo, hoje? Qual minha reação quando vejo uma situação de fome e miséria como a dos irmãos Yanomami ou de algumas tribos da África e outras? O que eu e minha família podemos fazer para aliviar o sofrimento e melhorar a condição de vida ao menos de alguns?
Textos bíblicos: Rm 5, 12-19; Mt 4, 1-11; Sl 50(51).
Dom Jaime Pedro Kohl – Bispo Diocesano