A terra não é plana – Marília Gerhardt Oliveira
Houve muitos luminares no decorrer da História, entre os quais Eratóstenes (Cirene, 276 a.C. — Alexandria, 194 a.C.) que foi um matemático, gramático, poeta, geógrafo, bibliotecário e astrônomo da Grécia Antiga, conhecido por calcular a circunferência da Terra.
É considerado o pai da Geografia na Antiguidade, em função dos importantes estudos sobre as medições da Terra que realizou. Foi um dos principais Cientistas e Pensadores da Grécia Antiga.Praticamente não havia assunto pelo qual Eratóstenes não se interessasse: Filosofia, História, Gramática, Poesia, Geografia e Matemática. Tudo o atraía e sobre cada um desses assuntos ele escreveu trabalhos de grande valor. Astronomia e números, porém, eram seus temas prediletos e, como toda Ciência Grega de então sofria a influência das ideias de Pitágoras, Eratóstenes formou-se pela linha pitagórica, a qual admitia teorias muito avançadas para a época. Aceitava, por exemplo, que a Terra fosse uma esfera solta no espaço, girando em conjunto com várias outras ao redor de um núcleo central de fogo(o Sol), numa antevisão do sistema que só bem mais tarde Copérnico enunciaria.
O Faraó Ptolomeu III do Egito nomeou-o o bibliotecário-chefe da Biblioteca de Alexandria, a mais importante da Antiguidade, que chegou a possuir mais de dois milhões de papiros em seu acervo antes de ser destruída num incêndio criminoso. Há várias versões sobre quem ordenou esse atentado que privou, certamente, a Humanidade de um tesouro inestimável. Exerceu este cargo de 236 a.C. até sua morte.
Por volta do ano 220 a.C. a crença mais aceita era o Terraplanismo, embora houvesse quem admitisse que a Terra era esférica, mas ninguém sabia dizer qual a medida de sua circunferência. Inconformado com esse estado de coisas, Eratóstenes resolveu sanar a falha, para tanto, utilizando como dados a distância entre Alexandria e Syene, a data de 21 de junho e um ângulo formado pelo Sol ao meio dia concluiu que era de 40.000 quilômetros.
Para medir o tamanho da Terra, Eratóstenes raciocinou assim: Syene e Alexandria situavam-se quase sobre o mesmo meridiano (linha equivalente à circunferência da Terra). Syene ficava praticamente sobre o Trópico de Câncer. Portanto, no dia de solstício de verão, ao meio-dia, os raios solares incidiam perpendicularmente, ou seja, a 900, sobre a cidade. No mesmo dia, à mesma hora, ficavam a 83,20 sobre Alexandria, afastada 800 quilômetros de Syene. Vendo que a um segmento de circunferência medindo 800 quilômetros correspondia uma diferença de 7,2º na incidência dos raios solares, Eratóstenes precisou apenas fazer uma regra de três simples para achar o correspondente aos 3600 da circunferência terrestre. Obteve como resultado 40.000 Km.
Dos três dados requeridos para o cálculo, apenas a distância entre as cidades apresentava dificuldades para a obtenção. Lembremos que na época, 200 a.C., não havia muitas alternativas confiáveis, a mais prática seria a contagem de passos a ser realizada. Eratóstenes contratou um atleta para percorrer as centenas de quilômetros em linha o mais possível reta e sem sucumbir à exaustão. Mas, como contar os passos? Elaborou uma solução genial.Suspendeu no pescoço do atleta três bolsas: uma deixou pender para o lado direito, a segunda para o esquerdo e a terceira sobre o peito. Numa das laterais, cem pequenos seixos e orientou que, a cada cem passos um fosse transferido para o lado oposto. O centésimo contabilizaria 10.000 passos e, este, seria depositado na bolsa frontal. Invertendo o processo a número 99 iria para o peito e assim sucessivamente. Observe-se que, a cada transposição diminuiria um seixo e isso teria de ser considerado ao final. Orientações finais: lacrar as bolsas e as trazer de volta para o contratante. Matemático da categoria de Eratóstenes, não teve dificuldade para tomar conhecimento do total e, com uma simples multiplicação, encontrar a distância percorrida.
Passados mais de 2.000 anos, os estudiosos foram conferir os cálculos de Eratóstenes e tiveram uma grata surpresa: a nova medição, realizada com equipamentos de precisão e modernos sistemas de cálculo, resultou numa cifra praticamente idêntica à do sábio, ou seja, 40.070 Km.
Os cálculos de Eratóstenes sobre a dimensão da Terra não foram aceitos na época e séculos decorreram antes de ser abandonada a teoria do Terraplanismo no mundo civilizado. Como poderia ser admitida uma Terra esferoide? Numa Terra plana havia estabilidade, numa esfera os habitantes da parte inferior cairiam no vácuo circundante. Lembremos que não conheciam a força da gravidade. Isaac Newton viria a publicar os estudos e formular a Lei da Gravitação Universal em 1867 d.C.
De repente, não mais do que de repente, ressurge o Terraplanismo. Estupefatos, assistimos personagens guindados à liderança (temporariamente) se apoiarem em retrocessos inimagináveis, ignorando a Ciência enquanto homens e mulheres frequentam estações espaciais, comunicações se apoiam em satélites e se planejam viagens interplanetárias.
Se não fosse trágico culturalmente, seria hilário. Mas educar um povo é uma nobre responsabilidade para pessoas capazes e vocacionadas a viver (e deixar viver) com base na verdade, o que parece constranger aqueles que se permitem continuar manipulando de forma torpe segmentos vulneráveis da sociedade (que deveriam merecer bem mais respeito).
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