As festas de Porto Alegre – Jorge Vignoli
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Outro dia eu trocava com mestre Agra lembranças sobre os cinemas de antigamente em Porto Alegre, os chamados cinemas de rua que, aos poucos, pelo aparecimento dos shoppings, feneceram. E quantos cinemas havia em Porto alegre!
Os festejos populares, claro que infinitamente inferiores aos números de cinemas, também existiram na cidade. Alguns permanecem até hoje, como a secular procissão dos Navegantes, que atrai milhares de fiéis fervorosos que cumprem seus votos e promessas.
O evento vem resistindo a tudo, até mesmo a proibição do séquito, há anos, de seguir pelo rio Guaíba. Não seria tempo para que os responsáveis repensassem na volta da procissão pelo Guaíba, do Cais à Igreja dos Navegantes, resgatando – ao menos nisso – o nosso desamparado rio.
O desfile de 7 de Setembro também continua e as crianças, nesse dia, o que mais esperam é a passagem dos “tanques de guerra”, sem saberem, na ingenuidade infantil, que aquele artefato é um poderoso instrumento de destruição e morte.
Recordo da festa de São João no inverno frio de junho. Erguiam-se pelas ruas fogueiras e, no seu em torno, a meninada soltava rojões, empinava pandorgas e se comia pinhões. Relembro da Parada da Mocidade dos colegiais que desfilavam com suas bandas marciais, sendo que a das Dores despontava invencível.
Os colégios católicos, a cada ano, obrigavam os alunos a acompanhar a procissão de Corpus Christi, que saia da casa do Arcebispo, na rua Mostardeiro, e seguia pela Independência até a Catedral.
Ao longo do trajeto, sempre que o Irmão Regente se distraía eu e os colegas, aos poucos, íamos abandonando o cortejo a tal ponto que, na Praça da Matriz, poucos ou nenhum de nós chegávamos ao fim. Na aula seguinte, colérico o Irmão vociferava que todos que haviam escapulido da procissão haveriam de arder no fogo do inferno, caso não cumprissem a penitência imposta. Dura era a vida do cristão!
Pois, entre as festas que continuam está o carnaval de rua de Porto Alegre (se bem me lembro, ano passado não aconteceu). E li num jornal que, agora, no último fim de semana, houve desfile das escolas e que, os Imperadores do Samba, foi o vencedor.
Se os desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro com toda a coreografia, colorido, luxo e muito dinheiro são maçantes – pois quem viu uma passar, viu todas – para nós gaúchos sobra o quê? Fico solidário, com pena de fazer dó com essa gente que, espontânea e incansável, busca manter vivo o desfile.
Mas de que forma é possível dar crédito à festa diante da literal pobreza e do apático desfile das nossas escolas? Não bastasse isso, ainda jogaram as escolas para o longínquo Porto Seco.
Assim como os cinemas e as bandas marciais dos colégios, o carnaval de rua de Porto Alegre acabou. Pensando bem, creio que nunca existiu.