Bolsonaro, o popular – Jorge Vignoli
BOLSONARO, O POPULAR
Recentes pesquisas de popularidade do atual inquilino do Alvorada — que, vez por outra, aparece também pelo Planalto — dão conta positiva da sua imagem. Essa figura pífia, de extrema direita, sempre foi cético quanto aos danos da pandemia. Insensível ao que se passa no Brasil, mesmo diante da disseminação incontrolada do vírus atestou, definitivamente, que utiliza antolhos (a senhora bolsonarista, o senhor próspero empreendedor, que se apossaram enrolados no “auriverde pendão da minha terra”, não sabem o que é “antolhos”? Pois o grande Aurélio, entre outras, define como “peças de couro ou de outra matéria opaca que se colocam ao lado dos olhos das cavalgaduras…).
Refluíndo, a imagem de Bolsonaro parece navegar num sereno lago azul, muito mais do que o seu par, Donald Trump, que já vai tarde, por mais contestáveis ao pensamento racional que sejam as suas atitudes. A última pesquisa Data Folha apontou que, 37 por centos dos pesquisados, enxergam o atual governo como “ótimo ou bom”, e 32 por cento viram como “ruim ou péssimo”. O espantoso: “ruim e péssimo” caiu em relação à ultima pesquisa! E a pesquisa vai longe: mais da metade dos entrevistados não atribuem nenhum tipo responsabilidade ao mandatário pelas mortes por coronavírus, esquecendo da fúria presidencial contra as restringências ao distanciamento social e ao uso de máscara, e que demitiu o ministro mais popular do governo, e brigou com outros e, também, com governadores, e apoiou manifestantes insulflando a fechar o Supremo Tribunal Federal.
O fato de nada disso ter prejudicado a presidência de Bolsonaro é um reflexo de seu apelo particular, bem como as irracionais divisões das esquerdas no Brasil. Bolsonaro veio à tona como um estranho anti- establishment, canalizando a frustração e o cinismo público generalizado sobre as classes políticas e o governo do país. Durante a pandemia, ele apregou um culto ao individualismo e à autossuficiência e, não ao contrário de Trump, insistiu que o país não pode se dar ao luxo de fechar negócios para manter o vírus sob controle.
Num misto de estultice, acacianismo e tom verborrágico “rousseffiniano”, soltou essas pérolas: “Tudo gira em torno da pandemia e precisamos parar com isso”. “É uma gripezinha”. “Todos nós vamos morrer. Todo mundo aqui vai morrer”. … “Temos que deixar de ser um país de maricas”. “E daí? Não sou coveiro!”.
A marca distinta de bravata de Bolsonaro manteve o apoio de sua base leal, de elites empresariais e homens de classe média. Mas sua popularidade também cresceu entre os pobres do Brasil, que se beneficiaram de meses de transferências diretas de dinheiro que seu governo implementou, graças ao Congresso, no início deste ano por causa da pandemia. Dezenas de milhões de brasileiros receberam uma bolsa mensal, uma migalha, que agora, na virada do ano — como diz a Carta de Getúlio —, se quedarão desamparados.