Com sabor de glórias imortais – Sérgio Agra
COM SABOR DE GLÓRIAS IMORTAIS
O ano, 1969. Noite de domingo. Eu acabara de retornar de Alegrete onde fizéramos, eu e meus parceiros do Teatro Novo Porto Alegre, a apresentação da peça “A Fossa”, de autoria e direção de Ronald Rade.
Na semana anterior eu recebera das mãos do grande mecenas do Teatro Brasileiro, Paschoal Carlos Magno, o troféu de Melhor Ator no Festival de Teatro de Bom Jesus.
Se no final de semana anterior meu pai dera uma sutil torcida no nariz, desta feita ele fora mais incisivo – muito, mas muito mais! – ao ouvir minha voz exultante, entusiasmada de filho prodígio, sem ser pródigo, noticiando-lhe que o cachê pela apresentação única em Alegrete equivalera a dois meses do meu salário no Instituto de Previdência do Estado.
– Alto lá! – ele bradara! – Estudante profissional aqui em casa, nunca! – e em seguida deitou sentença definitiva. – Matricula-te num Cursinho Pré-Vestibular e vais cursar uma faculdade à tua escolha, desde que não seja a de Artes Cênicas!
Acompanhei uma estonteada mosca que voejava em torno do lustre da sala e após minutos que a meu pai pareceram a própria Eternidade, hesitante sussurrei – Direito…
Houvesse Tony Ramos conhecido o episódio do “diálogo” entre pai e filho ele faria um preito de eterna gratidão ao “Seo” Agra.
Ponto, nova linha, parágrafo.
Acadêmico de Direito, prestei concurso para a Caixa Econômica Estadual onde trinta anos mais tarde me aposentei na sua Consultoria Jurídica. Meu início naquela Instituição fora no Setor de Abertura de Contas e Captação de Recursos. Era o auge da Caderneta de Poupança. Desenvolvi um projeto em que aquelas pequenas cadernetas poderiam ser confeccionadas nas cores azul e branca, com o emblema do Grêmio Football Porto-alegrense, e vermelha e branca, com a insígnia do Sport Club Internacional. O paraquedista político, um tal de bergmuller, que chefiava a Captação de Recursos, felicitou-me com tapinhas às costas, tipo aqueles dados somente por capachos incompetentes, e simplesmente “sumiu” com o meu projeto.
Anos mais tarde, graças ao crime cometido por Antonio Brito – a extinção da Caixa Econômica Estadual do Rio Grande do Sul –, o Banrisul não apenas foi contemplado com o espólio das Carteiras da Caixa como passou a “vender” seu produto (cartão magnético de conta corrente) nas cores e com os símbolos de Grêmio e Inter.
Dito isso – o longo prolegômenos e desafogo emocional – passemos a fatos mais doces, ao mesmo tempo salgados e criativos que há de estar vendendo tal água em deserto, que motivaram as anamneses do antigo acadêmico de Direito com pendores de inventivo publicitário. Doces porque foram presentes da Guiga que chegara do supermercado, salgados porque se tratavam de uns pacotes de Deutschips, as batatinhas lisas e rústicas para acompanhar os aperitivos, criativos porque as embalagens traziam impresso um enorme distintivo do Tricolor – sem esquecer as três estrelas de ouro que no alto rebrilham – e sob este o inconfundível, o inimitável, o primeiro e único dístico: “Com sabor de glórias imortais”.
O Inter igualmente foi agraciado nas embalagens das Deutschips. Ignoro, no entanto, se a legenda a ele dedicada possui a mesma força, igual energia como a do meu Imortal Tricolor.