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Como passar o resto da vida entubando

…Meditar e surfar tem muitas semelhanças nas técnicas, assim como nos resultados. Os sentidos são como tiranos, bombardeando descontroladamente sua mente com novidades até ela parecer um mar revolto. O objetivo da meditação é o de acalmar as ondas de sua mente e controlar seus pensamentos, de forma que você possa aumentar seu poder de concentração. Surfar é uma maneira de focalizar a atenção num nível onde a mente se torna silenciosa e quieta.

Durante aqueles momentos de intensa concentração, todas as preocupações ou problemas são esquecidos temporariamente, e somos preenchidos de satisfação e paz de espírito. Esse é exatamente o mesmo resultado que se espera obter pela meditação.

A diferença entre concentração e meditação é apenas uma questão de grau. Sua mente está geralmente voltada para pensamentos vagos. Durante a concentração ela ainda se desvia, mas na meditação a mente está por conta própria, mantém-se em uma única frequencia de pensamento. Desenvolver a habilidade de parar as ondas fluidas do pensamento permite-nos um vislumbre do nosso verdadeiro Ser, o real que está sempre feliz, satisfeito e consegue bastante ondas.

Os Yogis chamam isso de autoconscientização e nos dizem que está ao alcance de qualquer um que seja efetivamente interessado e dedicado. No Raja Yoga, a sexta e sétima etapa para a iluminação é a concentração e a meditação. A oitava é chamada de Samadhi ou superconscientização, isto é um estado além do tempo e espaço, quando a mente e o corpo são transcendidos e existe total união. Nesse estado, o meditante e o objeto de concentração se tornam uma única coisa. Shaun Tomson certa vez disse em uma entrevista, durante seus dias de glória em Off-the-wall e Backdoor Pipeline, que havia momentos quando ele efetivamente sentia-se como se estivesse controlando a onda.

A princípio pensei que fosse a mais egocêntrica das declarações jamais feitas por um surfista. Num segundo momento contudo, acreditei que Shaun entrou nesse estado de samadhi ou de superconscientização e estava em total harmonia com a onda, que sabia o que iria acontecer antes do tempo real. Depois, de volta a praia, ele podia apenas usar o seu ego para explicar os momentos de total não-ego. É o ego que gera a sensação de separação ou dualidade entre o ser individual e o Absoluto. A realidade é imutável e estática, o mundo que vemos é apenas ilusão porque olhamos para ele sem estarmos iluminados. Portanto, nós apenas vemos o que queremos e não o que realmente está lá para ser visto.

Mas, voltando a terra, aqui precisa-se acreditar que estamos nas – ou perto das – sexta e sétima etapas do Raja Yoga, sempre que vamos surfar. Ás vezes, até entramos em Samadhi, mesmo que apenas por breves instantes. Se um dia puxado de surf revelar-se mais cansativo do que qualquer um de nós quisesse ou pudesse imaginar, então por quê nos sentimos tão satisfeitos e gratificados depois?

De onde vem a energia para continuar a remar de volta para mais uma onda, após uma longa sessão? Por quê você nunca sente como se já houvesse feito tudo o que podia fazer surfando, independentemente do nível da suahabilidade? Não ficamos com a impressão de que sempre há mais espaço para melhorar?

Por quê todas as lições que aprendemos nas ondas, funcionam tão bem – senão melhor – quando estamos fora d'água? Chamo a isso de Realização do Surf e é melhor você acreditar que este é o caminho para uma vida mais longa e melhor. Continue a remar que o resto é fácil…

Gerry Lopez

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