Deputado propõe política estadual de inclusão digital
O deputado Raul Carrion (PCdoB) protocolou o Projeto de Lei (PL) 50/2008, que institui a política estadual de inclusão digital e o sistema estadual de inclusão digital. A idéia do parlamentar é organizar e definir as linhas gerais de uma política de inclusão digital no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul. A base física do processo de inclusão que o projeto prevê são os chamados telecentros, podendo também as escolas da rede pública serem utilizadas como sede. O parlamentar também coloca como prioritário o uso do software livre, valorizando os avanços conquistados no estado por organismos da sociedade civil na defesa do uso de programas livres. Outro item importante da proposta é a conversão de equipamentos eletrônicos proibidos e contrabandeados – os chamados caça-níqueis – para serem utilizados como equipamentos de educação e formação.
“Precisamos pegar este conjunto de iniciativas e transformar, sistematizar em uma política pública”, explica o único representante do partido comunista com assento no Parlamento gaúcho. “Hoje a inclusão digital é uma questão básica de cidadania, e a interconexão mundial por computadores é uma realidade. Porém, mesmo com o barateamento do equipamento, a ampliação do acesso e dos esforços do governo federal, de alguns estados e capitais, o que vemos são iniciativas pontuais”, afirma Carrion. “Entendemos que a questão merece uma política de Estado, que os governos tenham a inclusão digital como um de seus objetivos, viabilizando convênios e atraindo a contribuição da iniciativa privada para a inserção de comunidades, principalmente as mais carentes e com vulnerabilidade social”.
Para Carrion, o projeto de inclusão digital do governo federal – Computador Para Todos – Projeto Cidadão Conectado – que prevê financiamento oficial da Caixa Econômica Federal e linhas de crédito do BNDEs para a aquisição de equipamento, tem se revelado um sucesso. Com o aproveitamento das máquinas caça-níqueis que vêm sendo apreendidas pela Polícia Federal para serem utilizados como computadores em telecentros e escolas da periferia a um custo baixo, segundo ele, as condições para a institucionalização de uma política pública para o meio é uma possibilidade concreta. “A inclusão digital significa, antes de tudo, melhorar as condições de vida de uma determinada região ou comunidade com a ajuda da tecnologia. Incluir digitalmente não é apenas alfabetizar a pessoa em informática, mas melhorar os quadros sociais a partir do manuseio de computadores. Um incluído digitalmente não é aquele que apenas utiliza essa linguagem para trocar e-mails, mas aquele que usufrui desse suporte para melhorar as suas condições de vida”, explica.
O deputado argumenta, finalmente, com avanços estabelecidos em diversos países onde a inclusão digital tem alavancado o desenvolvimento econômico e social, embora possuam níveis de renda e acesso à tecnologia abaixo dos do Brasil. “Há exemplos de comunidades rurais em Honduras que passaram a trabalhar com computadores movidos por energia solar e conexão via satélite”, diz Carrion. A Índia, cita, com apenas 0,5% da população conectada à web e apenas 2,2 linhas telefônicas para cada cem habitantes, exporta softwares e especialistas em tecnologia. A Costa Rica, um país com a economia baseada na agricultura, hoje exporta mais circuitos integrados (chips) do que produtos agrícolas.
Apoio
O Coordenador do Comitê Organizador da Associação Software Livre, Sady Jaques, que promove há oito anos em Porto Alegre um fórum mundial de entidades, governos, empresas e cidadãos voltados à troca de experiências e criação de projetos e plataformas de uso livre, saúda a iniciativa do parlamentar gaúcho e propõe que ela possa ser indutora de um processo de ampliação do acesso e da educação digital nos municípios. Ele lembra que novas concepções governamentais, que vão ao encontro da era tecnológica e do mundo virtual, requerem esforços neste sentido. “Não existe governo eletrônico se não houver acesso; se quisermos pensar em serviços de Estado para a totalidade da população precisamos de políticas vigorosas de inclusão”, afirma Jaques.
Ele enfatiza que, no Rio Grande do Sul, a Secretaria da Educação “é refém das políticas do governo federal e das empresas, não tem iniciativas ou projetos próprios”. O mesmo refere-se à Companhia de Processamentos de Dados do Estado, a Procergs, que teve iniciativas tímidas na virada do milênio – entre os anos 2000 e 2001 – instalando alguns dos primeiros telecentros em Porto Alegre. Mas, segundo ele, parou por aí. Jaques defende, por último, que uma política de Estado não pode ficar na dependência de reaproveitamento de máquinas caça-níqueis para ampliar a oferta de computadores à população. “São necessários recursos orçamentários para programas, é necessário um número mínimo de computadores para as escolas todos os anos”, cita.
Histórico
A Assembléia gaúcha vem experimentando iniciativas concretas para viabilizar a ampliação do acesso à informação e à tecnologia. O deputado Mano Changes (PP) protocolou, em 2007, Projeto de Lei (PL 134/2007) instituindo o Programa Estadual de Inclusão Digital do Jovem Residente na Área Rural do RS, cujo objetivo principal é a disponibilização de computadores com acesso à internet para jovens habitantes de áreas rurais. O desenvolvimento do programa, que visa gerar tecnologia para o agronegócio, está previsto para municípios que contam com um escritório da Emater.
Desde 2005, um programa da Organização das Nações Unidas (ONU), lançado no estado, prevê convênios com prefeituras municipais para a compra de computadores e impressoras para as escolas, com recursos da instituição internacional. O Programa Futuro Brasil Comum foi implantado em 1989, para atuação em diversas áreas, incluindo um projeto-piloto (à época) de inclusão digital, buscando atender a população carente afastada dos recursos tecnológicos disponíveis.
Ainda em 2005, a Assembléia gaúcha iniciou a assinatura de protocolos de cooperação com câmaras municipais para a implementação dos projetos-piloto Câmara.com e de Inclusão Digital e Participação Cidadã, coordenados pelo Interlegis do Rio Grande do Sul. O objetivo é formar multiplicadores para atuarem junto aos legislativos no sentido de qualificar servidores e vereadores para utilização de programas desenvolvidos no sistema Linux, de software livre. Neste período, alguns telecentros foram inaugurados em cidades-pólo do Estado, a exemplo de Pelotas – a Associação do Trabalho e Economia Solidária em convênio com a Petrobrás, em 2005 – e em Alvorada – o Telecentro Comunitário (em 2007), em parceria com a Secretaria da Juventude e Esporte local.
Em 2004, a Assembléia gaúcha instalou a Frente Parlamentar Estadual pelo Software Livre e Inclusão Digital, a primeira do gênero em um parlamento estadual. A decisão, que resultou da adesão de 28 parlamentares de diferentes partidos, foi um passo adiante na busca para constituir uma política oficial de acesso livre à Internet, abrindo caminhos para a implantação de telecentros de forma mais ágil e ampliada. A Frente Parlamentar foi um passo à frente na questão do software livre.
Em 2002, o deputado Elvino Bohn Gass (PT) viu a Casa aprovar seu Projeto de Lei (PL 06/2002), que dispõe sobre a utilização de programas de computador no âmbito do Estado. A proposta previa que as instituições deveriam utilizar, preferencialmente, em seus sistemas e equipamentos de informática, programas abertos, livres de restrições proprietárias quanto à sua cessão, alteração e distribuição. À época, o parlamentar argumentou do enorme custo para os cofres públicos ao adquirirem programas obrigatórios restritivos, fornecidos por transnacionais que dominam o setor.