Indígenas Mbya Guarani podem ser parceiros da pesquisa agropecuária gaúcha
Eles já habitavam as terras do litoral norte do Rio Grande do Sul antes da chegada dos portugueses ao Brasil. Foram expulsos e dizimados. Hoje, vivem uma situação de exclusão social, mas lutam para reconquistar espaços onde possam viver em harmonia com a natureza e preservar sua cultura. Mais de 80 indígenas Mbya Guarani que estão em processo de retomada de terras em uma área do Departamento de Diagnóstico e Pesquisa Agropecuária da Secretaria da Agricultura, Pecuária e Irrigação (DDPA/Seapi), em Maquiné, acreditam que podem ajudar a pesquisa agropecuária gaúcha. Eles participaram, nesta terça-feira (6), da quarta edição do “Seminários da Pesquisa” que ocorreu na unidade da antiga Fepagro. “Se a gente ficar, não vamos atrapalhar o trabalho de pesquisa, a gente apoia e defende a natureza. Nós somos a natureza, somos seus guerreiros guardiões”, garantiu o membro da comunidade, Merong Tapurumã.
Segundo Merong, onde existirem indígenas vai haver floresta, água, vida. “Essa terra é sagrada para nós, queremos cuidar dela. Quem produz alimento no Brasil são povos indígenas e agricultores. O nosso povo tá ameaçado de extinção, somos pisados, roubados, massacrados, só queremos o suficiente para viver. Peço respeito com os povos indígenas, com nossa luta”, disse emocionado.
O pesquisador do Centro de Pesquisa do Litoral Norte do DDPA, Rodrigo Favreto, explicou que a realização do seminário ocorreu durante a Semana do Meio Ambiente de Maquiné e em um contexto de retomada indígena. “Nossa convivência tem sido tranquila e pacífica, e estamos dispostos ao diálogo”, afirmou.
Seminários da Pesquisa
Os visitantes conheceram as pesquisas e os projetos desenvolvidos no local, nas áreas de melhoramento genético de feijão e fruticultura (abacaxi, consórcio banana-juçara, goiabeira serrana e lichia).
O pesquisador e biólogo do DDPA, Juliano Bertoldo, apresentou o “Programa de Melhoramento de Feijão – Redução do custo energético na lavoura com maior produtividade e sustentabilidade”. Ele contou que o melhoramento de feijão teve início na década de 1950, e as primeiras linhagens surgiram na década de 1960. E que, na década de 1970, a estação do Litoral Norte tornou-se o principal centro de pesquisa com feijão como órgão ligado ao Estado.
Bertoldo informou que as atuais linhas de pesquisa com feijão na unidade são duas: uma de redução do custo energético na agricultura – com promoção da fixação biológica de nitrogênio (FBN) e resistência a estresses de ambientes (hídricos e de temperatura) –, e outra de conservação dos recursos genéticos de feijão – com segurança alimentar e banco de germoplasma.
“Pesquisas em fruticultura” foi o tema da engenheira agrônoma do DDPA, Raquel Paz da Silva. Conforme ela, é importante realizar pesquisas nessa área no litoral norte devido à grande diversidade ambiental, social e agrícola. “É aqui que se concentra a maior produção de banana e abacaxi do Estado, e a região é potencial para frutíferas nativas e de clima tropical”, comentou.
Raquel destacou o projeto desenvolvido “Abacaxi Terra de Areia”, cujo objetivo foi validar, fomentar e disponibilizar tecnologias sustentáveis de produção de abacaxi no litoral norte do Rio Grande do Sul, através do resgate, seleção e multiplicação do abacaxizeiro “Pérola Terra de Areia”.
Outro projeto abordado foi “Indicação Geográfica (IG) do abacaxi de Terra de Areia”. “Estamos estudando clima, solo, história, cadeia de comercialização e a percepção do consumidor relacionada a esse produto. Ao final, será estabelecida a relação entre o “abacaxi terra de areia” e seu território de origem sob diferentes aspectos, buscando mostrar se tal cultura se constitui em um patrimônio coletivo do local. A partir dos resultados, os próprios agricultores, através de suas associações, poderão requerer uma IG para o abacaxi terra de areia”, esclareceu.
O engenheiro agrônomo Favreto abordou “Recursos Genéticos – Vegetais Nativos”. Ele enfatizou o projeto sobre a palmeira juçara. De acordo com o pesquisador, a planta possui importância econômica e social, pois suas folhas servem como forragem para gado, artesanato e ornamentação (alternativa à samambaia). “Ela produz o palmito, que está na lista das espécies ameaçadas. Suas sementes podem ser usadas como mudas para plantio e paisagismo. E seu fruto é semelhante ao açaí, cujo mercado está em expansão”.
Encaminhamento
Os presentes, de diversas instituições, decidiram encaminhar uma carta ao secretário da Agricultura, Pecuária e Irrigação, Ernai Polo, mostrando a importância da pesquisa realizada pelo DDPA e seu reconhecimento junto à comunidade da região.
Participaram do evento representantes da Seapi; Emater/RS-Ascar; Secretaria do Desenvolvimento Rural, Pesca e Cooperativismo (SDR); Procuradoria-Geral do Estado do Rio Grande do Sul (PGE); Secretaria do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do RS (Sema); Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Maquiné (STR); Conselho Estadual dos Povos Indígenas (Cepi); Ação Nascente Maquiné (Anama); e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs).
Darlene Silveira