Moreira define seus primeiros 100 dias no comando da Assembléia como de muito aprendizado
O presidente da Assembléia Legislativa, deputado Alceu Moreira (PMDB), definiu seus cem dias à frente da Casa, que serão completados neste sábado (10), como um período de muito aprendizado. “Ser presidente do Parlamento significa uma grande responsabilidade”, afirmou, ao falar sobre os primeiros meses de sua gestão.
Mentor do Programa Sociedade Convergente, Moreira demonstrou empolgação ao contar suas expectativas em relação aos resultados da proposta que “cria um sistema de gerenciamento de participação qualificada para a busca de resultados para o Estado”.
Ele quer ser lembrado como o presidente que conseguiu resgatar o papel do Parlamento e recuperar o reconhecimento por parte da população, do trabalho dos deputados.
Como o senhor avalia os primeiros cem dias de sua gestão?
Alceu Moreira – Foram cem dias de muito aprendizado. Aprendo muito com meus colegas. O fato de ser presidente do Parlamento significa uma grande responsabilidade. É preciso ter disciplina. Tenho me esforçado ao máximo para merecer essa responsabilidade de estar fazendo uma parte da história deste Parlamento. Tenho trabalhado muito para que as pessoas possam compreender o que estamos propondo.
O Sociedade Convergente é hoje uma realidade que representa a possibilidade de trazermos para esta Casa um debate político importante para a sociedade, resgata o papel do Parlamento. Deixa os deputados com mais alegria ao exercer seu próprio mandato. Há coisas que ainda não puderam ser feitas em cem dias, mas esse período foi ótimo. Foram dias de muito trabalho sem cansaço, de alegria, de fazer com prazer e com paixão.
Tenho absoluta certeza de que, no final do ano, vou sair da presidência tendo cumprido a caminhada que me foi atribuída. Teremos instituições sólidas montadas, a imagem da Assembléia está a cada dia melhor e mais considerada, com deputados que se somam na luta de forma solidária. A sociedade tem vindo buscar aqui um canal de expressão confiável. Estou feliz e satisfeito.
O papel do Parlamento mudou? Qual, na sua concepção, deve ser o papel do Parlamento?
Moreira – O Parlamento deve ser um canal de expressão confiável da população.
A Assembléia tem que ter, de maneira livre e soberana, a participação confiável e clara da população. De que forma se faz isso? Como um grande laboratório de formulação de políticas públicas. A fiscalização feita pelo Legislativo não significa buscar o erro do Executivo, mas, sim, está na exigência feita pelo poder de pressão organizado no cumprimento de demandas das políticas públicas. Ir atrás disso, da construção da própria política pública, da organização da sociedade e da participação efetiva e qualificada nos temas é uma meta que tem sido atingida.
Tenho a impressão de que esse é um objetivo que o Parlamento precisa buscar definitivamente.
O senhor pode explicar isso melhor?
Moreira – Quando um deputado se dá por satisfeito ao prestar um serviço ou apenas ao fazer um discurso bonito na Tribuna, sem se preocupar em somar, o discurso acaba sendo vazio. Se ele for para o debate político e agregar valores ao contribuir para a construção de um projeto, e se impedir que aconteçam erros, ele terá acrescentado. Tenho a impressão de que o Sociedade Convergente consegue passar a idéia para as pessoas de que é possível construir coisas positivas a partir do Parlamento.
E, principalmente, de que é possível construir com o contraditório, sentando frente a frente com o adversário político, e ter idéias divergentes de maneira fraterna. Isso, buscando, sempre que possível, a possibilidade de somar forças e melhorar o que se pensa. Acho que consagramos isso aqui. Não tenho a pretensão de ser modelo para nada, mas gostaria muito que um deputado, principalmente federal, não se consagrasse no Rio Grande do Sul pela quantidade de emendas que faz ao orçamento.
Mas que pudesse ser um pensador da política pública, um mascate das idéias, e que buscasse um projeto de país de acordo com o seu partido. Cá para nós, aqui na Assembléia, tenho recebido esse espaço tolerante e genero dos meus colegas parlamentares.
O senhor teve o cuidado de agregar à sua gestão um grande projeto, que é o Sociedade Convergente. Como surgiu essa idéia?
Moreira – Não se chega às vésperas dos 54 anos e se conclui que descobriu a roda. Quem faz política, traz a sua história na bagagem. Eu trouxe os tempos em que jogava bola, brincava com a minha carreta de sabugo, jogava bolinha de gude, o jeito que minha mãe mandava eu lavar os pés. Tudo isso está comigo. Fui reunindo as necessidades e privações que tive na formação da minha personalidade.
Aqui, onde cheguei, foi o lugar em que juntei tudo isso e coloquei em prática. Sempre fui um político que trabalhou no limite do contraditório. Só que eu percebi que queria buscar a possibilidade de construção na presidência da Assembléia. Li um livro da Chiara Lubich (italiana criadora do movimento dos Focolares), que trabalha com o movimento político pela unidade. Depois, participei em Rosário, na Argentina, de um seminário sobre este movimento, estive na Itália trabalhando nisso, mas é claro que só tive interesse pelo tema porque o assunto fechava com as minhas convicções próprias. E esse assunto era simpático e familiar. Adoro e tenho um convívio enorme com o sistema cooperativista, acho fundamental as pessoas se reunirem com absoluta confiança entre si e fazerem um processo no qual um pouco de muitos gera a riqueza de tantos.
Temos o hábito no Rio Grande do Sul, onde cultiva-se um discurso no qual um é frontalmente contrário ao outro, de ficarmos no contraditório, em vez de buscar parcerias para construirmos políticas de Estado. Percebi que havia um espaço neste sentido. Há o momento de fazer política ideológica, quando devemos mostrar claramente as diferenças em relação a outros partidos, e o momento de construir políticas de Estado. Aqueles temas de Estado que não tem partido. A partir destes temas, criamos através de um grupo de estudo, o Sociedade Convergente. O programa cria um sistema de gerenciamento de participação qualificada para buscar os resultados para o Estado.
Com a posse do Colégio Deliberativo do Fórum Democrático, um dos alicerces do Sociedade Convergente, qual a sua expectativa?
Moreira – Tenho certeza de que o Colégio será um instrumento que acabará se constituindo no único órgão com força política para fazer planejamento de médio e de longo prazo. Isso por sua formação heterogênea. Será o único capaz de produzir projetos de lei com iniciativas para 30 anos. Os próximos governantes não vão ter que inventar a roda. Não terão de fazer propostas mirabolantes.
Consultarão o planejamento e encontrarão tudo pronto. Se ele for muito competente e hábil, poderá fazer muito melhor do que se imaginou que poderia, mas encontrará desenhado o que terá de ser realizado. Serão chamados os melhores especialistas de cada instituição presente no Fórum para fazer o trabalho de consolidação preparatória de cada tema definido pelo Colégio Deliberativo. Eles dirão qual é o índice, o indicador e o texto, mais adequado para tratar o assunto. A partir daí, iremos para as nove regiões funcionais.
E as populações vão poder dar uma contribuição riquíssima em cima dos dados que levarmos. Iremos debater, por exemplo, que planta de transporte ou energética as populações querem em sua região. E, depois desta etapa, acontecerá uma grande reunião em Porto Alegre, no Teatro Dante Barone, com as maiores autoridades mundiais, estaduais e nacionais. Neste encontro colheremos o necessário para fazer um projeto de lei sobre o tema, que tramitará naturalmente aqui.
O texto aprovado gerará planejamento estratégico nas mais diversas áreas, para o tempo que for necessário: 10, 20 ou 30 anos. O que acontecerá? Quando a lei for feita, milhares de pessoas terão cumplicidade com o texto. A universidade já terá acompanhado tudo e levado aos seus alunos, os Conselhos Regionais de Desenvolvimento (Coredes) já terão discutido em todas as suas regiões, nós já teremos ido às nove regionais.
Acabará definitivamente a idéia de que recurso do orçamento é administrado pelo governo e apenas criticado ou aprovado pelos deputados. Não seremos apenas um cartório que homologa o que o governo pensa, mas seremos planejadores da aplicação de recursos públicos. Isso é que mudará.
Entre as ações que se destacaram em seus 100 dias estão a questão do leite e o Gabinete de Emergência, montado para ajudar as vítimas das chuvas no Rio Grande do Sul. Esse tipo de iniciativa irá continuar, com o Parlamento se posicionando em situações de necessidades?
Moreira – O Gabinete de Emergência foi uma questão de envolvimento espontâneo do Parlamento. Temos uma estrutura magnífica e bem organizada com uma assessoria parlamentar que conhece toda a Brigada Militar e a Defesa Civil por dentro. Temos deputados e chefes de gabinete com ótimos relacionamentos.
Na verdade, somos um batalhão enorme, capaz de mobilizar. O que fizemos, foi mobilizar isso. Tinha, por exemplo, alguém que precisava de uma escavadeira e não havia uma na cidade em que era necessária. Mas eu tenho condições de ligar para o prefeito de outro município e pedir o equipamento. Isso nós podemos fazer neste grupo. Quero contribuir. Falei com todos os deputados que se colocaram à disposição para isso.
A Assembléia fez um trabalho muito bonito, mas não havia o desejo de se valorizar por isso. Foi muito mais no sentido de contribuir com a sociedade, ao colocar à disposição essa estrutura pública organizada que temos.
E a questão do leite?
Moreira – A questão do leite foi diferente. Era um problema fático, com um gargalo imediato, e que foi trabalhado em uma Oficina de Solução. Sabe-se qual é o tema, reúne-se todos os atores políticos envolvidos ao redor de uma mesa e, a partir de então, cria-se o passo a passo de soluções. O governante não pode dizer apenas que vai ver se resolve o problema. Isso não adianta.
A gente quer saber se será para amanhã. Se for para amanhã, a que horas. E volta no outro dia. E assim por diante. Fomos administrando isso. Agora, estamos cobrando da Secretaria da Fazenda a política do leite definitiva, prometida para um prazo de 180 dias. Esse é um papel do Parlamento. Somos articuladores e facilitadores de soluções.
Somos pagos para isso. De que me adianta fazer um discurso feroz contra ou a favor do governo enquanto os produtores de leite quebram? Precisamos é de soluções imediatas.
De que maneira o senhor gostaria que sua gestão fosse lembrada?
Moreira – Como o trabalho de alguém que andou pelos corredores da Assembléia com absoluta humildade e que tinha compreensão do que era possível fazer neste movimento. E que queria a compreensão dos colegas. E que tenha transformado esse Parlamento em um grande fórum de debates sobre os temas mais importantes para o Rio Grande do Sul.
E que os deputados possam ser aplaudidos como grandes líderes, catalisadores, pela população ao chegarem em qualquer lugar público.
Não é possível que, em um estado politizado como o nosso, as 55 pessoas escolhidas deputados sejam hostilizadas. Isso é um equívoco. Vou trabalhar muito para que o Parlamento passe por esse processo de mudança.