Nova variante do vírus Oropouche causa surto em região do Brasil
A recente onda de febre Oropouche que atingiu o Brasil em 2024 foi provocada por uma nova linhagem viral, conforme pesquisa liderada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
O estudo revelou que o vírus, identificado como OROV BR-2015-2024, surgiu na Região Amazônica entre 2010 e 2014, resultado de um rearranjo genético entre cepas de países vizinhos.
Esses achados foram publicados na renomada revista Nature Medicine, que já divulgou uma versão preliminar para garantir a rápida disseminação dos dados, ainda que o artigo passe por mais revisões.
O surto repentino registrado no início de 2024 acendeu um alerta epidemiológico, principalmente no estado do Amazonas.
O aumento nos casos, que se alastrou para todas as regiões do país, já vinha sendo monitorado de perto pelas autoridades de saúde desde anos anteriores.
Dados coletados entre agosto de 2022 e fevereiro de 2024 apontam mais de 6 mil casos em 140 municípios da Região Norte.
O sequenciamento genético de 382 amostras em quatro estados confirmou que a nova linhagem foi a responsável pela epidemia.
A pesquisa sugere que o vírus circulou de forma silenciosa por quase uma década antes de gerar o surto atual.
Segundo os especialistas, o rearranjo genético que deu origem ao OROV BR-2015-2024 pode ter ocorrido quando uma pessoa ou animal foi infectado por duas variantes do vírus, permitindo a fusão dos materiais genéticos.
Essa nova cepa apresenta modificações na superfície viral que dificultam a ação dos anticorpos, aumentando a preocupação de que pessoas previamente infectadas pelo vírus Oropouche possam não estar completamente protegidas.
Além disso, um estudo preliminar, realizado por outro grupo de cientistas, indicou que a nova linhagem se replica mais rapidamente nas células humanas em comparação com a primeira cepa do vírus, descoberta na década de 1960 no Brasil.
A febre Oropouche é uma arbovirose que não possui tratamento específico, com sintomas semelhantes aos da dengue, como febre alta, dores no corpo e articulações, náuseas e, em casos raros, encefalite.
O principal vetor da doença é o mosquito Culicoides paraensis, também chamado de maruim ou mosquito-pólvora, comum em áreas úmidas.
Embora esteja associado a ambientes rurais, o maruim pode ser encontrado em regiões urbanas com água e matéria orgânica, como jardins e hortas. Esporadicamente, o pernilongo Culex quinquefasciatus também pode transmitir o vírus.
No Brasil, surtos esporádicos de febre Oropouche têm sido registrados desde os anos 1970, especialmente na Amazônia.
No entanto, a recente disseminação atingiu proporções maiores, com casos em todas as regiões do país. Em alguns estados, foram identificados casos de transmissão local, enquanto outras infecções ocorreram em viajantes que retornaram da Amazônia.
Em um fato inédito, a Bahia registrou em julho de 2024 as primeiras mortes pela febre Oropouche no mundo, o que tem gerado alerta entre autoridades sanitárias internacionais.
Os pesquisadores da Fiocruz também levantam a hipótese de que as mudanças climáticas, associadas ao desmatamento, podem ter influenciado o comportamento do mosquito vetor, contribuindo para a disseminação da doença.
Eventos climáticos extremos, cada vez mais frequentes na Amazônia, podem ter favorecido a proliferação dos insetos e o contato com a população. Isso pode explicar por que a nova linhagem viral circulou por tanto tempo antes de causar um surto de grandes proporções.
O estudo confirma que a febre Oropouche segue um padrão sazonal, com maior disseminação nas estações chuvosas e transmissão persistente, mas reduzida, no período seco.
A propagação do vírus ocorreu tanto pelo deslocamento dos mosquitos quanto pela movimentação de humanos infectados.
Em dois terços dos casos analisados, o vírus se espalhou dentro de 2 km por dia, compatível com o alcance de voo dos vetores.
Nos outros casos, a dispersão foi maior, ultrapassando 10 km diários, o que indica a participação humana na disseminação.
A pesquisa envolveu diversas unidades da Fiocruz, espalhadas por cinco estados brasileiros, além da colaboração de laboratórios de saúde pública e outras instituições científicas.