O furo da meia
Nada mais justo que se autopresenteasse com uma bela e merecida viagem à Europa.
Em Cannes, instala-se na ampla suíte, com vistas para o Mediterrâneo, do aristocrático Carlton Hotel.
Na noite do sábado, elegantemente vestido com terno, camisa, gravata e sapatos Carlo Pignatelli e, no pulso esquerdo, mais do que um relógio, a preciosa joia da Patek Philippe, o Calatrava Travel Time Two Zone, automátco, Ouro 18k, dirige-se ao Palm Beach Casino.
Com ar blasé, circula entre as mesas de bacará e roleta quando, de repente, não mais que de repente, vislumbra a belíssima estampa de Charlotte Marie Pomeline Casiraghi, filha da princesa Caroline de Mônaco e de seu segundo e finado marido,Stefano Casiraghi.
Para Charlotte, cuja beleza lembra sua avó materna, a atriz Grace Kelly, e apesar de sua condição de figura do jet set internacional, assediada pelos homens mais ricos do planeta, a presença de Maquissuel não passa despercebida. Ante o olhar de êxtase do nosso tupiniquim compatriota, devolve-lhe o mais discreto dos sorrisos. Ato contínuo se ergue da mesa onde até então jogava e dirige-se ao Buffet para apanhar uma nova taça de champanhe. Era tudo o que ele rogava ao Divino para iniciar conversa.
Apresentações feitas, o francês recalcitrante do brasileiro em nada obsta a conversação. A princesinha não apenas dá sinais de inequívoco deslumbramento ante a beleza de Maquissuel; imagina o ardor do sangue latino que deve percorrer aquele homem. Dali para a suíte do Carlton o caminho, como de fato o foi, seria natural.
Música em surdina, a suíte à média luz, o champanha transpirando no balde de gelo, Maquissuel despe, primeiro o paletó, depois desfaz o nó da gravata, desabotoa o colarinho e, como um perfomancer, lança para longe o sapato do pé direito.
A princesinha arregala os belíssimos olhos violetas, dá um grito de extremo horror e, correndo, abandona, para sempre a suíte do Carlton Hotel.
O furo da meia de seda preta deixara à mostra a marca inapagável das origens de alguém com um nome como o de Maquissuel Alecssandro: o dedão direito e, sob a enlutada unha, a tarja de sujeira ali acomodada há mais de quinze dias.
A região de Gramado, Canela e Nova Petrópolis nada deve para as internacionais estações de inverno de Vevey, Lausanne, Lucerna e Château-d'Œx, nos Alpes Suíços, ou para a italiana Cortina d'Ampezzo, na região do Vêneto. Os turistas que acorrem para a serra gaúcha extasiam-se ante a majestática natureza, a singular arquitetura das cidades, a rica e diversificada gastronomia e a gama de permanentes eventos, sobretudo o do Natal Luz.
Toda a magia, no entanto, corre o risco de perder-se se o visitante, ao retornar daquele paraíso a Porto Alegre, via Taquara, vê-se obrigado a percorrer o inferno que é o trecho da RS-118, em Gravataí, para acessar a Freeway.
Ali está o furo, como o da meia de Maquissuel Alecssandro, que deixa à mostra o descaso de décadas dos órgãos públicos (ir)responsáveis.