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O furo da meia

Maquissuel Alecssandro, 28 anos, 78 kg, milimetricamente distribuídos em seu 1,85m, olhos esverdeados que rutilam no rosto de um Adônis – apesar do patético nome lavrado na sua certidão de nascimento –, por onde passa é a causa dos gemidos orgásticos da mulherada, sobretudo agora, que tem em seu nome uma conta bancária de sete dígitos, conquistada no árduo labor, durante os últimos sete anos, da intermediação entre empreiteiras e o seleto e poderoso feudo de ordenadores de despesas brasiliense.

Nada mais justo que se autopresenteasse com uma bela e merecida viagem à Europa.

Em Cannes, instala-se na ampla suíte, com vistas para o Mediterrâneo, do aristocrático Carlton Hotel.

Na noite do sábado, elegantemente vestido com terno, camisa, gravata e sapatos Carlo Pignatelli e, no pulso esquerdo, mais do que um relógio, a preciosa joia da Patek Philippe, o Calatrava Travel Time Two Zone, automátco, Ouro 18k, dirige-se ao Palm Beach Casino.

Com ar blasé, circula entre as mesas de bacará e roleta quando, de repente, não mais que de repente, vislumbra a belíssima estampa de Charlotte Marie Pomeline Casiraghi, filha da princesa Caroline de Mônaco e de seu segundo e finado marido,Stefano Casiraghi.

Para Charlotte, cuja beleza lembra sua avó materna, a atriz Grace Kelly, e apesar de sua condição de figura do jet set internacional, assediada pelos homens mais ricos do planeta, a presença de Maquissuel não passa despercebida. Ante o olhar de êxtase do nosso tupiniquim compatriota, devolve-lhe o mais discreto dos sorrisos. Ato contínuo se ergue da mesa onde até então jogava e dirige-se ao Buffet para apanhar uma nova taça de champanhe. Era tudo o que ele rogava ao Divino para iniciar conversa.

Apresentações feitas, o francês recalcitrante do brasileiro em nada obsta a conversação. A princesinha não apenas dá sinais de inequívoco deslumbramento ante a beleza de Maquissuel; imagina o ardor do sangue latino que deve percorrer aquele homem. Dali para a suíte do Carlton o caminho, como de fato o foi, seria natural.

Música em surdina, a suíte à média luz, o champanha transpirando no balde de gelo, Maquissuel despe, primeiro o paletó, depois desfaz o nó da gravata, desabotoa o colarinho e, como um perfomancer, lança para longe o sapato do pé direito.
A princesinha arregala os belíssimos olhos violetas, dá um grito de extremo horror e, correndo, abandona, para sempre a suíte do Carlton Hotel.

O furo da meia de seda preta deixara à mostra a marca inapagável das origens de alguém com um nome como o de Maquissuel Alecssandro: o dedão direito e, sob a enlutada unha, a tarja de sujeira ali acomodada há mais de quinze dias.

A região de Gramado, Canela e Nova Petrópolis nada deve para as internacionais estações de inverno de Vevey, Lausanne, Lucerna e Château-d'Œx, nos Alpes Suíços, ou para a italiana Cortina d'Ampezzo,  na região do Vêneto. Os turistas que acorrem para a serra gaúcha extasiam-se ante a majestática natureza, a singular arquitetura das cidades, a rica e diversificada gastronomia e a gama de permanentes eventos, sobretudo o do Natal Luz.

Toda a magia, no entanto, corre o risco de perder-se se o visitante, ao retornar daquele paraíso a Porto Alegre, via Taquara, vê-se obrigado a percorrer o inferno que é o trecho da RS-118, em Gravataí, para acessar a Freeway.

Ali está o furo, como o da meia de Maquissuel Alecssandro, que deixa à mostra o descaso de décadas dos órgãos públicos (ir)responsáveis.

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