O general sabia demais… – Sergio Agra
O GENERAL SABIA DEMAIS…
Parte I
Capítulo XIII da Série As Crônicas de Aleph
Enfim o primeiro dia do ano letivo. Guarda-pó engomado, as quatro letras iniciais do nome do Grupo Escolar caprichosamente bordado na manga esquerda; o couro da pasta ainda cheirando a novo; lápis, borracha bicolor, apontador de lápis, cadernos para desenhos, para exercícios de caligrafia e o quadriculado para “fazer as contas” — e que em tempo mínimo ganhariam “orelhas” —, compunham os indispensáveis petrechos estudantis. O austero casarão do colégio, localizado numa ladeira de íngreme aclive, inusitadamente exibia ao longo do leito da rua uma das fachadas laterais.
Era por esta face, através de um imenso portão de ferro, que se alcançava o espaçoso átrio e a escadaria que dava acesso ao frontispício. A edificação — se avistada do pátio de recreio, aos fundos do educandário, compreendia cinco pavimentos — era ladeada pelos altos e intransponíveis muros de pedra que a separavam do Palácio do Governo. Fora exatamente na sala de aulas do centenário colégio que Aleph descobriria a paixão: — Maria do Carmo M.B.
Quatro anos depois Maria do Carmo não apenas mudaria para um bairro distante e bucólico: fora, em regime de internato, matriculada em colégio dirigido por austeras religiosas. O general M.B. pressentira que — com o projeto de transferência da Capital Federal no Rio de Janeiro para o Planalto Central, a partir da construção de Brasília, os acontecimentos políticos e sociais estavam ganhando celeridade e rumos temerários —essa mudança asseguraria a vital imperturbabilidade à formação da personalidade da filha. A clausura e a rígida orientação religiosa e pedagógica da escola atestavam o julgamento do general. E o general M.B. parecia estar bem informado, pois o preço disso tudo não tardaria a se evidenciar.