O que diria Millor Fernandes – Jorge Vignoli
Atribui-se a Millor Fernandes a máxima de que “a filosofia é uma ciência tal, que o mundo sem a qual, seria tal e qual”. Millor era um grande sarcástico, tanto quanto genial pensador. A própria assertiva buscando zombar da Filosofia, por si só, traz uma reflexão de cunho filosófico.
Pois, três acontecimentos desses últimos dias na área da cultura e da educação obrigam a admitir que tudo, no país, parece ter perdido o sentido: os senhores do Poder, através de uma concepção obscura pretendem fechar as Faculdades de Filosofia e Sociologia e, de quebra, reduzir em trinta por cento os orçamentos das Universidades Federais.
Fixo-me em uma das notícias: a extinção da Faculdade de Filosofia. E o argumento que sustenta o absurdo é de que primeiro é preciso ensinar as pessoas a ler, escrever, fazer contas, ensinar um ofício e, assim, fortalecer o núcleo familiar e melhorar a sociedade. Mas ninguém estará proibido de estudar Filosofia, basta que pague uma faculdade particular.
Deduzo que o raciocínio de onde saiu a brilhante intenção jamais soube da existência de Heráclito, o primeiro dialético da história, ou de Diógenes, que vivia numa barrica (por favor, senhores do Poder, não confundam com o personagem “Chaves”, interpretado por Roberto Bolaños), de Platão, de Sócrates (não misturarem também com Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira, o jogador de futebol e médico). A quem eu me refiro são os filósofos dos pré-socráticos até a época contemporânea, que construíram o pensamento Ocidental.
No meu tempo de estudante (quero crer que, por enquanto, o substantivo “estudante” não provoca à “dinastia” do Poder nenhuma aversão) chegava um momento, completado o Ginásio, em que o aluno havia de escolher: seguir a área técnica ou voltar-se para as humanidades. Eu cursei o Clássico. E durante três anos, na vã esperança de ser alguém na vida tive contato, entre outras, com a Psicologia, Sociologia e Filosofia. Depois, adiante, enfrentei uma matéria chamada “Filosofia do Direito”.
Agora, extinguir a Faculdade de Filosofia no ensino público, é demonstrar uma visão turva, estreita e preconceituosa, de quem jamais deveria ocupar um cargo público de influência e mando. É alardear a obtusidade e a esquizofrenia intelectual. É desconhecer que a Filosofia é a ciência que indaga e procurar a finalidade primeira da existência, busca a resposta do “que somos, de onde viemos, para onde vamos”, questiona a existência do homem diante “do ser e do nada”.
E o que não é acreditável diante da intenção de por fim à Faculdade de Filosofia é que, justamente quem anda teorizando e influenciando a alta cúpula do Governo Federal, a mandar mensagens via Twitter do país do mister Donald Trump, justamente é quem se autodenomina filósofo. Se fosse vivo –– de tudo “isso daí, tá ok?” –– o que diria Millor Fernandes?