Pais de jovem morto por choque em parada de ônibus receberão R$ 250 mil e pensão vitalícia
Rio Grande do Sul: Os Desembargadores da 9ª Câmara Cível do TJRS, por unanimidade, decidiram aumentar o valor da indenização aos pais do jovem que morreu após uma descarga elétrica em uma parada de ônibus, em 13/4/2010, em Porto Alegre. Cada um receberá R$ 125 mil e pensão vitalícia.
Valtair Jardim de Oliveira tinha 21 anos e cursava o último ano do ensino médio.
Ele morreu após se encostar em uma parada de ônibus da Avenida João Pessoa, por volta das 23h, enquanto aguardava o ônibus para voltar para casa após a aula.
Caso
Eva Jardim de Oliveira e Inácio Garcia de Oliveira ingressaram com ação indenizatória contra o Município de Porto Alegre, a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), a Sadenco Sul Americana de Engenharia e Comércio Ltda. e a Instaladora Elétrica Mercúrio Ltda.
Eles relataram ter havido imperícia e negligência pois eletricistas da EPTC teriam ido ao local para confirmar reclamações de energização da parada de ônibus antes da morte do filho e teriam apenas isolado o local com fita.
Os pais acusaram as empresas de não terem engenheiros suficientes para supervisionar as instalações e a Secretaria Municipal de Obras e Viação (SMOV) por não ter fiscalizado a instalação elétrica.
Além do valor de indenização por dano moral, foi solicitado pensão vitalícia, ressarcimento de tratamento psicológico, medicamentos e taxas de cemitério.
Em primeira instância o Município e a EPTC foram condenadas a pagar para cada autor o valor de R$ 100 mil por danos morais. E também a pagar medicamentos e outras despesas que a família teve por conta da morte do filho.
O Município recorreu ao Tribunal de Justiça alegando que a empresa Mercúrio foi quem realizou o trabalho no poste e que se fosse viável os servidores da SMOV fiscalizarem todos os serviços, não haveria a necessidade de contratar um consórcio de empresas para tanto.
De acordo com a defesa, a SMOV não foi comunicada sobre problema de energização na parada de ônibus. E que as irregularidades técnicas competiam às empresas contratadas para a realização do serviço.
A EPTC disse que as empresas que prestaram o serviço deveriam responder pelos danos causados. Afirmou que a titularidade do serviço é do Município, pois a EPTC não seria responsável pela fiscalização do sistema de iluminação das vias públicas.
Salienta ter sido a única das quatro demandadas a comparecer no local para verificar sobre reclamações quanto a choques, tendo avisado aos órgãos competentes sobre a necessidade de reparo.
A Empresa negou a sua responsabilidade, afirmando ter agido no limite de sua competência, conhecimento e técnica.
Já os autores recorreram para que as empresas rés Mercúrio e Sadenco fossem incluídas no feito, pois agiram em nome do Estado, prestando serviço público pelo Município.
Eles defenderam a responsabilidade solidária entre os réus e afirmam que a Mercúrio foi quem realizou o trabalho no poste onde havia a energização, contaminando a parada de ônibus que causou a morte de seu filho.
Dizem que as empresas privadas negligenciaram a inexistência de um aterramento, e, mesmo assim, realizaram a instalação elétrica. Eles também pediram a reforma da sentença referente ao valor da indenização.
Acórdão
O Desembargador relator, Carlos Eduardo Richinitti, citou que um mês antes da morte de Valtair já haviam relatos de outros choques. Em seu voto, ele afirmou que a energia elétrica possui um trato especialmente delicado, na medida em que não pode ser vista, cheirada ou tocada; ao mesmo tempo, consiste em perigosíssimo artifício, com alto grau de letalidade, mormente porque só pode ser sentida quando, por vezes, é tarde demais.
O magistrado citou o teor da perícia que constatou falha na isolação da instalação elétrica do conjunto de luminárias no local e que, de acordo com depoimento de perito, se constatou que um aterramento eficaz funcionaria como último recurso, evitando a morte.
Sobre as responsabilidades, com relação ao Município, o relator frisou que o contrato era claro quanto a sua obrigação de fiscalizar os serviços realizados pelas empresas. Com relação à EPTC, o Desembargador relatou que a empresa pública incorreu em omissão específica em duas ordens: a primeira, relativa à ausência do dever de fiscalização e solução de reclamações de usuários a respeito de choques percebidos na parada de ônibus; e a segunda, em relação à ausência de aterramento da estação, cuja manutenção é de sua incumbência.
Ele ainda destacou que nos autos não encontrou informação de que a EPTC tenha comunicado a SMOV ou outro órgão municipal competente acerca dos problemas relatados, tampouco tenha solicitado urgência da solução do problema.
E também que não foi feito isolamento do local até a solução, já que verificou a presença de tensão elétrica anormal em uma das averiguações efetuadas na parada.
Segundo o Desembargador, as evidências indicaram que no momento da montagem da luminária e respectivo fechamento de sua estrutura um dos fios ficou prensado contra uma borda cortante da carcaça interna, o que, com o tempo, resultou na sua abrasão, exposição do cobre e consequente falha de isolamento.
Assim, o potencial elétrico que passava por este fio acabava se dissipando por toda a estrutura metálica da luminária, conforme consta no voto do relator.
Quanto à legitimidade passiva das empresas privadas, ele salientou que o caso deve ser analisado com foco nas disposições da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que determina ao contratado a responsabilidade pelos danos causados diretamente à Administração ou a terceiros, decorrentes de sua culpa ou dolo na execução do contrato, não excluindo ou reduzindo essa responsabilidade à fiscalização ou o acompanhamento pelo órgão interessado.
Pelo exposto, de acordo com o magistrado, não restaram dúvidas de que o consórcio demandado detém responsabilidade pelo curto-circuito verificado na luminária instalada no poste que ficava na parada de ônibus.
Sobre a pensão, o Desembargador ressaltou que não haveria necessidade de prova de que os genitores dependiam dos proventos recebidos pelo filho, ou de que ele ajudava com as despesas da casa.
Para ele, em casos de famílias de baixa renda incide a presunção da existência de auxílio mútuo entre os integrantes. Porém, ainda incluiu que há indícios nos autos de que Valtair era músico e trabalhava em uma empresa de informática.
Em um trecho da decisão, o Desembargador afirmou: A perda de um filho em tão tenra idade, o sonho interrompido da formatura, do compartilhar de vitórias da vida, dos netos, do cuidado no ocaso, são dores que ganham, como costumo dizer em processos análogos, contornos não afeitos à limitação humana.
No caso específico, quando a morte decorre de algo absolutamente evitável, resultando do descuido absoluto com a coisa pública, a dor qualifica-se, pois à saudade que tanto dói se agrega ao sentimento de indignação e revolta.
Desse modo, ele votou por reconhecer a responsabilidade das rés e pela presunção da dependência econômica entre os membros da família, determinando a obrigação de indenizar os pais.
O Desembargador aumentou o valor pelo dano moral para R$ 125 mil para cada autor. A pensão mensal ficou em 2/3 (dois terços) do salário mínimo nacional até os 25 anos de idade da vítima.
Após, será reduzida para 1/3 (um terço), pela presunção de que o empregado constituiria seu próprio núcleo familiar.
Quanto ao limite temporal do pensionamento, ele fixou a data em que o filho dos autores completaria 72 anos de idade ou até a morte dos genitores, o que ocorrer primeiro.
Os Desembargadores Tasso Caubi Soares Delabary e Eugênio Facchini Neto acompanharam o voto do relator.
Proc. nº 70083866707
TJ RS
Receba as principais notícias no seu WhatsApp