Previdência – Jorge Vignoli
O surreal parece ser a pauta da cena política em Brasília. Para ficar somente nessa semana, o ministro Sérgio Moro andou derrapando na última flor do Lácio, trocando “cônjuge” por “conje” e, o que é pior, repetiu a aberração. E prosseguiu tropeçando no verbo “vir”, misturando “vim” por “vier”.
Logo perguntarão – e com razão – e o Lula com as suas violentas bicancas no vernáculo? É verdade! O Lula atropela o idioma, e foi duas vezes Presidente da República, e possivelmente seria a terceira, caso não estivesse preso. Por que troçar, então, do ministro Moro? É que Moro, antes de ministro da Justiça, foi magistrado, após rigoroso concurso público de provas e títulos. E o que se exige de um magistrado é, no mínimo, o manejo impecável do idioma, principalmente quando se empola o discurso para o lado do “juridiquês”.
E na CCJ, que trata de Reforma da Previdência, o deputado Zeca Dirceu chamou o ministro Guedes de “tigrão” e “tchutchuca”, ao que respondeu o ministro: “é sua mãe, e a sua avó”! A troca de farpas era que nem saída de colégio de guri. Só faltou alguém cuspir no chão e passar o pé por cima, para as vias de fato acontecer.
Pois, com o circo armado, tramita na Câmara a reforma da Previdência, que é mais ampla daquela enviada pelo presidente Temer, que já era ruim ao trabalhador. O atual projeto de reforma, simplesmente desmonta o sistema de proteção social, e aqueles que pouco ou nada se preocupam com os mais humildes conseguem o feito de se superar, e se reinventarem a cada momento.
E isso é muito grave! Um país civilizado não pode abrir mão de um sistema que protege os menos favorecidos. O sistema previdenciário, obviamente, precisa de reformulações, eu diria aperfeiçoamento, especialmente nas fontes de financiamento.
A Previdência é um tema tão importante para a sociedade que ela carece ser fruto de um debate colocado na mesa, com contas abertas, dizer o que arrecada e quanto gasta, quem não paga e quem deve, para quem são oferecidas as isenções, pois há incontáveis empresas que não pagam a Previdência, sequer repassam os valores que, mensalmente, descontam dos seus empregados. Isso a CCJ não fará, pois trabalha com cartas já suficientemente definidas.
Sem transparência, pretendem copiar para o Brasil o modelo Chileno de seguridade. E o modelo chileno não serve nem para o Chile, nem para o Brasil. Modelo que só favorece o capital financeiro, já abarrotado de dinheiro pela benesse da agiotagem oficial.
Em cima disso, pretendem instituir uma Previdência privada individual e obrigatória. O trabalhador terá de escolher o banco, e o banco vai administrar o valor. E vão valer-se do PIS/PASEP e do FGTS, dinheiro que já é do trabalhador, para criar um saldo para essa poupança individual. Isso vai levar o trabalhador à desproteção completa, e à miséria, e à morte por inanição. No Chile, quando o idoso se aposenta, seu fundo dura três, quatro ou cinco anos, depois termina o dinheiro.
O governo quer estabelecer, também, a idade mínima de 65 anos à aposentação, e para que se tenha direito, mesmo que seja um salário mínimo, o trabalhador tem que comprovar, pelos menos, 40 anos de contribuição. Isso é cruel. Isso é baixar a proteção social, é jogar o velho à míngua. E mais, não é só o Regime Geral que sofrerá alterações.
O governo pretende fazer isso com os regimes próprios de Previdência da União, dos estados e dos municípios. Todos os servidores públicos – à exceção dos militares, é claro – serão submetidos a essa regra, ao mesmo cruel e desumano sistema. Entrementes, deputado e ministro como meninos primários batem boca na Câmara Federal.