Quem matou Alírio Cássio di Zabanetta Noronha? – II
Como eu já dissera no capítulo anterior, não conhecia o autor. Por isso, após meses de exaustivos trabalhos – que eu intercalava com a escrita do meu romance e os artigos semanais para minhas colunas em três jornais –, outro não poderia ser o teor do meu texto de apresentação.
O mais novo escritor dos altos da Avenida Independência – se é que assim podemos, afetivamente, chamar aquela febril confluência de praça, ruas e avenida –, Alírio Cássio Di Zabanetta Noronha, me foi apresentado pelo Dr. Jorge V. Através deste, Zabanetta Noronha solicitava-me que revisasse o original que acalentava, um dia, editar e – a glória! – publicá-lo.
Devo, aqui, registrar meu confiteor. Como, na ocasião, não conhecia o autor pessoalmente, ao iniciar a leitura das páginas primeiras pensei: deve ser um patriarca na casa dos seus noventa anos que, antes de partir, pretende ver o seu tríduo terreno completado: filhos criados, árvore plantada e o livro de piegas memórias.
Zabanetta Noronha ainda está longe dos noventa – e até já poderia ser um nonagenário, pois a avoenga idade em nada desmerece um homem. Não sei se plantou a sua árvore; porém, este delicioso e enternecedor “A Praça Júlio de Castilhos e a Turma do Murinho” compara-se a um horto onde florescem todas as emoções, nas quais leitor algum que tiver a grata felicidade de lê-lo poderá ficar imune. A pieguice é algo que ficou inteiramente alijado na narrativa.
Impossível, independente de idade, não se deixar envolver e, digo mais – graças à sinceridade e à linguagem sem floreios do autor –, vivenciar as hiistórias, os fatos, as trampolinagens, até, daquele irreverente e inconseqüente grupo de jovens no transcorrer dos díspares anos sessenta/setenta, em que mesmo o regime de exceção não logrou silenciar.
Tive assomos de riso na maior parte da leitura. Mas o encaminhamento para o desfecho das narrativas e o destino que cada uma das suas personagens tem de seguir, deixou-me, como há de deixar em quem o ler, com um certo travor na alma, levando-nos, o que é razão essencial de toda obra literária, a refletir sobre nossa humana condição.
Alírio Cássio Di Zabanetta Noronha, com toda a certeza, conduz-nos a isso.
E agora, ali estava ele, o livro que recém me chegara às mãos: um belo e caprichado exemplar, a fotografia da capa – de uma delicadeza e de uma serenidade ímpares – mostrava a sua grande protagonista, no entorno da qual as histórias iriam acontecer: a Praça Júlio de Castilho.
Inúmeros e antigos retratos ilustravam os lugares, os “causos” ali narrados e os protagonistas daqueles acontecimentos. Na ficha técnica, o meu nome como revisor; algumas páginas adiante o texto de apresentação da obra por mim assinado.
Isso tudo justificava a minha satisfação e o meu orgulho. Por isso, nada mais justo que compartilhassem da minha alegria os bons e leais amigos que, eu sei, são devotados e vorazes leitores.
Por esta razão, antes mesmo de sair para almoçar, enviei e-mail para cinqüenta e cinco daqueles, informando-os do endereço eletrônico do autor, para onde poderiam ser encaminhados os pedidos. Enviei, também por e-mail, o meu agradecimento ao Dr. Jorge V pelo valioso presente e fazendo-o saber da divulgação que fiz à obra.
Ao retornar do restaurante, fui direto ao computador, pois já estou trabalhando num segundo romance que pretendo vê-lo publicado em breve. No canto inferior direito da tela, o ícone representando um envelope me alertava de novas mensagens a serem abertas. Uma delas era do Dr. Jorge V. Dizia:
“Mestre, você não leu o que está escrito na página 177?”.
Era uma pequena biografia do autor, Alírio Cássio di Zabanetta Noronha.