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Salários pagos pelo Estado favorecem desigualdade em Brasília

Estudo recente da Organização das Nações Unidas (ONU) aponta quatro capitais brasileiras na lista das 20 cidades mais desiguais do mundo, em termos socioeconômicos. Estão na relação Belo Horizonte, Fortaleza, Goiânia e Brasília. Com quatro capitais entre as as cidades injustas socialmente, o Brasil figura entre os países mais desiguais, atrás apenas da África do Sul, de Zâmbia e da Namíbia.

Segundo a ONU, as desigualdades do Brasil e de sua capital são muito próximas. O coeficiente de Gini (índice usado para calcular a desigualdade de distribuição de renda) do país é de 0,58 e o de Brasília, de 0,6. Segundo a metodologia para medir distribuição e concentração de renda, quanto mais perto de 1, maior a diferença entre os mais ricos e os mais pobres. Para especialistas, a desigualdade verificada em Brasília espelha a realidade do país e demonstra que em vez de ser “uma ilha da fantasia”, Brasília é uma cidade bem brasileira: extremamente desigual e com a renda concentrada em alguns setores.

Para a professora Marília Luiza Peluso, do Departamento de Geografia da Universidade de Brasília, (UnB), a capital cinquentona “não é uma ilha da fantasia”. Segundo ela, a expressão esconde que a cidade é “uma síntese do Brasil”. Em Brasília, opina, “as pessoas não ficam fora da realidade. Elas estão dentro e imersas exponencialmente na realidade nacional”.

“Vamos colocar as coisas no lugar certo, o Brasil é um país desigual. Brasília é uma cidade planejada, mas não é abstrata. A sociedade brasileira é extremamente desigual do ponto de vista socioeconômico, Brasília não tem porque ser diferente”, acrescenta Brasilmar Nunes, professor de sociologia da Universidade Federal Fluminense.

Para Marcelo Medeiros, professor de sociologia da UnB e técnico do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), chamar Brasília de ilha da fantasia é um ataque pejorativo. “O centro de São Paulo tem coisa que nenhuma parte do Brasil tem e nem por isso alguém chama São Paulo de ilha da fantasia, o Rio de Janeiro é a mesma coisa”.

Conforme Marcelo Medeiros, a desigualdade está muito relacionada ao mercado de trabalho, que em Brasília é muito particular. A cidade tem uma quantidade muito grande de funcionários públicos. Para o economista Carlos Reis, da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), “a distribuição de renda está associada à economia que tem o ponto forte no setor de serviço, que requer especialização cada vez maior e paga melhor”.

Para Joaquim Andrade, professor de economia da UnB, “não tem emprego melhor” que o setor público. Segundo ele, o Estado paga mais de duas vezes os salários pagos pelo setor privado, em postos com funções equivalentes e com a mesma exigência de instrução. No começo dos anos 80, o economista foi um dos autores do estudo A Distribuição Perversa da Renda Urbana no DF. Em sua análise, constatou que a má distribuição de renda em Brasília é provocada pelo trabalho. “Se aufere renda do capital ou do trabalho. No caso de Brasília, não tem renda do capital”.

De acordo com o Joaquim Andrade, o “mercado em Brasília praticamente não existe”. Ele estima que mais de 70% da renda do Distrito Federal são gerados pela área pública, a maior empregadora. Conforme o professor da UnB, o setor privado mais dinâmico na economia brasiliense é a construção civil, que “contrata mão de obra ultra barata. É uma China”, comparou.

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