Seis vezes (mais) amor: conheça a linda história de uma família de Capão da Canoa
Criar um filho pode ser considerado um desafio. Além de amor, proteção, carinho, atenção, paciência e orientação para a vida, a tarefa exige estrutura material. E, acima de tudo, querer ser pai/mãe. No caso da adoção, uma decisão planejada e muito esperada, a situação é a mesma. Mas e quando, no lugar de um, o casal ganha seis filhos de uma vez só? Foi o que aconteceu com Mauro e Aparecida da Rosa.
Os dois se casaram há oito anos e, desde o começo do relacionamento, concordaram que entrariam para a fila de adoção. Apesar de ele já ter quatro filhos, a esposa não poderia concretizar esse sonho pela via natural. O casal, de Capão da Canoa, foi até o Foro local e se habilitou. Como a maioria dos pretendentes, queriam uma criança de até dois anos e meio.
O tempo foi passando, sem sucesso, porque a maioria das crianças aptas a adoção têm mais de 10 anos, possuem irmãos ou apresentam problemas de saúde. A Oficial Escrevente Marciane Carvalho, da Comarca de Júlio de Castilhos, que auxiliou Mauro e Cida nessa busca, perguntou se o casal não toparia flexibilizar o perfil desejado. Eles concordaram: “Por que não adotar um maiorzinho?”, se perguntou Aparecida. ‘E poderia ser mais de um?” questionou a servidora da Justiça. “Sim, até três crianças”, respondeu ela.
Três meses após a mudança de perfil, Cida recebeu uma ligação da Justiça: lá viviam seis irmãos que poderiam dar a eles a tão sonhada família. “Na hora, eu e o meu esposo estávamos longe um do outro. O que eu respondo? Não eram três; eram seis”, contou Aparecida. “Ouvi a voz de Deus falando dentro do meu coração: respondi sim”, conta a mãe, emocionada.
A vida surpreenderia os dois. E a tão sonhada família não seria exatamente como imaginavam, já que o amor que tinham para dar era muito maior do que acreditavam ter. Assim, o casal foi até Júlio de Castilhos conhecer a turminha. O pai lembra emocionado do primeiro encontro: “Quando chegamos no abrigo, os vi descendo em fila… era uma dádiva de Deus que eu recebia bem na época do meu aniversário.”
Assim, aconteceu o encontro de almas com os filhos Andriele, de 12 anos, Vitória, 11, João Vitor, 10, Yasmin, 9, Raí, 8, e Anthony, 3. “Se havia outras crianças naquele lugar, naquele momento, eu não lembro. Só vi os meus filhos. Fui chamada de mãe já na primeira hora”, conta ela. A partir dali, Mauro e Cida retornaram para casa e deram início ao desafio de ampliar a casa em 1 mês para receber os filhos.
O casal conseguiu construir um segundo piso, onde hoje estão os quartos da família. As crianças conheceram a praia. Frequentam a escola. Participam de projetos sociais. Saem para pescar com os pais. Mais do que um lar, ganharam a chance de conhecer o verdadeiro valor de um amor de família. “Parece que já se conheciam há muito tempo”, define a Oficiala Escrevente Marciane.
“Fomos chamados de loucos. As famílias olham mais para a crise financeira e para as necessidades. Mas temos que dar as mãos, nos unir e acreditar nos nossos sonhos. Éramos dois. Agora somos oito! Não tem coisa mais gostosa”, resume Mauro.
Laços fortalecidos
A sentença concedendo a guarda definitiva dos seis irmãos saiu em 17/4/18. O Juiz Ulisses Drewanz Gräbner, do Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Júlio de Castilhos, destaca o vínculo afetivo que formou a família: “A presente decisão é mera formalidade para garantir que, a partir do trânsito em julgado desta sentença, também do ponto de vista formal, MAURO e APARECIDA sejam denominados ‘pais’ de Yasmim, Vitoria, Raí, Andriele, Antoni e João, seus filhos por opção, uma relação que se iniciou no amor, no afeto, na compaixão e na solidariedade.”
O magistrado ressaltou ainda a nobreza e compaixão dos pretendentes, que aceitaram acolher os seis irmãos, evitando a separação precoce entre eles. E encerrou a decisão com uma poesia, intitulada ¿Dar à luz¿, do poeta Bráulio Bessa:
Dar à luz
Dar à luz uma criança / é iluminar os seus dias
dividir suas tristezas / somar suas alegrias
é ser o próprio calor / naquelas noites mais frias
Dar à luz é estar perto / é sempre chegar primeiro
é ter o amor mais puro, mais honesto e verdadeiro
amar do primeiro olhar / até o olhar derradeiro
Dar à luz é se estressar / é não conseguir dormir
é ser quase odiado por dizer, não vai sair
Dar à luz é liberar, mas também é proibir
Dar à luz é ser herói com papel de vilão
é saber regrar o sim e nunca poupar o não
não é traçar o caminho é mostrar a direção
Dar à luz é ser presente nos momentos mais cruéis
é ensinar que os dedos valem mais do que os anéis
é mostrar que um só lar, vale mais que mil hotéis
Dar à luz é se doar é caminhar lado a lado
é a missão de cuidar, de amar e ser amado
é ser grato por um dia, também ter sido cuidado
é conhecer o amor maior que se pode amar
é a escola da vida que insiste em ensinar
que pra dar à luz a um filho não é preciso gerar
é entender que neste caso o sangue é indiferente
dúvido o DNA dizer o que a gente sente
é gerar alguém na alma e não biologicamente
pois não tem biologia e nem lógica
para explicar o amor de pai e mãe
não se resume em gerar
quem gera nem sempre cuida, mas quem ama vai
cuidar
vai cuidar independente da cor que a pele tem,
da genética, do sangue
o amor vai mais além
o amor tem tanto brilho
que quem adota um filho
é adotado também!
TJ RS