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Sobre a vacina chinesa: é confiável a ciência proveniente de países autoritários? – Dr. Sander Fridman

Sobre a vacina chinesa: é confiável a ciência proveniente de países autoritários?

Muito do conhecimento e da tecnologia disponíveis hoje no mundo foi produzido em países que na época eram autoritários e sem liberdade de informação, pensamento e expressão.

Mesmo assim, foi produzido, comumente,por pessoas que contavam com uma certa proteção do poder dominante, que lhes permitia um acesso especial à informação e ao conhecimento disponível, cuidando a cada passo para que seus achados ou conclusões não fossem vistos como inconvenientes.

Galileu Galilei, em 1633, protegido pela corte local,precisou tomar cuidados para não ter o mesmo destino de Giordano Bruno-queimado na fogueira em 1600, por que a igreja julgou que as descobertas dele contrariavam fundamentos da fé cristã.

Ou o oftalmologista e médico intensivista chinês, em Wuhan, Li Wenlian, que em 2019, que, ao tentar alertar seus colegas, autoridades e população sobre o novo vírus potencialmente letal, acabou preso, calado e morto.

Ou como Ai Fen (médica diretora responsável da Unidade de Emergências Médicas do Hospital de Wuhan), e Chen Qiushi(advogado e jornalista), em 2020,ambos desaparecidos, pelos mesmos motivos.

Qual a relevância do autoritarismo chinês para a confiança necessária aos que pretendem consumir suas tecnologias em saúde?Qual a relevância do autoritarismo chinês para a confiança que podemos ter nas tecnologias sensíveis e perigosas oferecidas por aquele país?

Qual a confiança que podemos ter na adesão de um país autoritário aos rígidos princípios éticos que norteiam as pesquisas médicas em todo mundo desenvolvido, relevantes para todos os países e povos que se organizam em torno da defesa do direitos humanos?

Como confiar em quem é capaz de matar,sequestrar e calar cientistas para que suas verdades deixem de ser ouvidos a quem de direito? Como confiar na ciência dos inimigos da verdade?

Por mais que reconheçamos os imensos avanços tecnológicos disponibilizados ao parque industrial de um país autoritário, não é de se esperar um projeto que vise a produção de novos e avançados conhecimentos em qualquer área do conhecimento seja possível ou competitiva onde o pensamento e o questionamento sejam aprisionados, onde as hierarquias de poder político prevaleçam sobre as de conhecimento.

Max Weber (Ciência e Política –duas vocações) e Piérre Bourdieux (Usos sociais da ciência: Por uma sociologia clínica do campo científico) debruçaram-se sobre as fronteiras e interdependências entre ciência e política.

Enquanto não pode prosperar o projeto científico sem um contínuo e determinado apoio político, tampouco será efetivo num contexto de faltada indispensável liberdade para mudar paradigmas, com suas repercussões, à vezes inevitáveis, no ambiente social, político e econômico, não raro amaldiçoadas pelo poder dominante –por exemplo, quando um efeito colateral, um novo vírus ou a ineficácia de um produto, são constatadas, solapando as expectativas de lucro ou domínio de grupos econômicos e políticos.

Dr. Sander Fridman é neuropsiquiatra, psicanalista cognitivista e perito psiquiatra. Doutorado em Psiquiatria (Neurociências) pela UFRJ, Pós-Doutorado em Direito (Teoria da Prova) pela UERJ.

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