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Somos todos iguais esta noite V – Sergio Agra

SOMOS TODOS IGUAIS ESTA NOITE

(Novela em cinco capítulos)

 Capítulo V

 Tania, Zoila, Lilia Rosa,Tâmara, Haydée* e o segredo de Morena

Somos todos iguais esta noite V – Sergio AgraMorena esclarece porque fora dar com os costados em Roma. Sim, ela é escritora, e o conto que enviara e selecionado pela emissora de televisão narra a história de Zoila.

“ZoilaGarcía vivia naquela época com o pai, o “sargento” José Aureliano, num ranchitonão muito distante de Santo Tomé, fronteira da Argentina, às margens do rio Uruguai. Certa madrugada de tempestade, a menina Zoilaacordara com o ruído da chalana atracando entre os maicás, nos fundos da propriedade. A cuscarada ameaçara o alarido. Aureliano, com um sussurrante “se quiedán quietos, perros”, arrefecera os guaipecas.”

“Os recém-chegados, quatro ou cinco, entraram na choupana. O líder, de uma beleza rude, os cabelos longos e a espessa barba, usava uma boina de pelúcia negra, ornada por uma pequena estrela de metal. O tom enérgico de sua voz não lhe desmentia o comando,Estoycontándoconusted, compañero Aureliano. Convoca loschiberos, nosotros partiremos mañanatemprano”.Acenando uma continência, José Aureliano fora expedito, Si, Comandante!

“Após a retirada do paiZoila vira-se a sós com o desconhecido. Não sentiu medo das trovoadas e dos relâmpagos que rompiam o negror da noite. Num átimo, os braços firmes daquele a quem chamavam de Comandante a envolveram, transportando-a da infância de menina criada distante da mãe à realidade de uma nova mulher. O alvorecer do dia seguinte levar-lhe-ia o pai e aquele nômade pelos caminhos do chaco, rumo à Bolívia. A partir dali os dias deZoila e do filho que carregaria no ventre seriam de um eterno esperar. Dera ao menino o nome daquele guerrilheiro duro e, ao mesmo tempo, de inusitada ternura.”

O sol recém havia rompido o horizonte. O gari se dispusera conduzir Morena ao aeroporto. Após acenar para um táxi ele quis saber, Para onde viaja a compagna? A escritora trazia desconsolo nas palavras, Volto para São Borja. Algum dia, quem sabe, o diretor da TV me chame outra vez.

A voz anônima nos alto-falantes noticia a última chamada para o voo com destino ao Rio de Janeiro. Os passageiros, em algaravias, buscam a sanfona de acesso à aeronave.

 Os novos amigos se abraçam. O gari por vez primeira parece esboçar em sua voz alguma ternura, Me senti fortemente atraído por ti… Em outras circunstâncias eu até te desejaria… que tivéssemos momentos a sós… Morena não logra esconder o pânico ante aquela declaração. Embaraçada ela pergunta, Durante todo o tempo você já sabia?… Sem constrangimento na voz rouca que sempre o caracterizou o gari prossegue, Sim, desde o momento em que te olhei pela primeira vez.Mas isso não tem a menor importância… Adeus, Ernesto! Atônita, Morena, levada de roldão pelos passageiros que embarcavam, volta a cabeça e grita, E você, como se chamas? Quem, verdadeiramente, você é?

O ronco das turbinas de um avião que decolava e o alarido dos viajores impedem Morena, de ouvir o que o gari lhe havia dito em resposta. Ernesto Guevara García, ou Morena García, apenas distingue-lhe o sorriso velhaco estampado e o aceno matreiro da mão esquerda, carente do dedo mínimo…

*Tania, Zoila, Lilia Rosa,Tâmara, Haydée, algumas das tantas mulheres que mantiveram relações amorosas com Ernesto “Che” Guevara.

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