Vacinas – Jayme José de Oliveira
PONTO E CONTRAPONTO- por Jayme José de Oliveira
“Por mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.
VACINAS
Se muitos decidem não tomar vacinas – e impedir que familiares o façam – estão coletivamente agindo para que outros morram ou fiquem sequelados. O Estado não pode permitir isso, muito menos estimular.
Não há problema em inserir vacinas entre as obrigações que possam ser impostas caso não se obtenha êxito nas tentativas de induzir a população utilizando a mídia para tanto. A vacinação não atinge seus objetivos – salvar vidas – quando depender apenas de decisões individuais. Só funciona quando aplicada de forma maciça.
Se a população não se torna receptiva a uma campanha organizada, o governo não tem apenas o direito, tem a obrigação de adotar medidas coercitivas – o uso do cinto de segurança enfrentou uma oposição ferrenha antes de se introjetar nos hábitos dos motoristas.
O direito do coletivo prepondera, inequivocamente, sobre o direito individual. Somos uma organização multicultural e mesmo em pleno regime democrático a liberdade individual não pode, jamais, preponderar. Quando o “EU” tenta se sobrepor ao “NÓS”, isso não é democracia, é anarquia e resulta numa sociedade anômica onde o que vige é a “Lei de Gerson”. Quando determinada pessoa, empresa ou corporação obtém vantagens ou exige direitos de forma indiscriminada, sem se importar com questões éticas, morais e, muito menos com os direitos dos outros elementos com os quais convive, está ultrapassando todos os limites.
O exemplo mais impactante, no Brasil, ocorreu durante o mês de novembro de 1904. O Rio de Janeiro, então capital federal, foi palco de uma das maiores revoltas urbanas ocorridas no país: a Revolta da Vacina. Milhares de habitantes protagonizaram nas ruas da cidade violentos conflitos com a polícia. O motivo era uma polêmica medida tomada pelo governo de Rodrigues Alves que convocou o sanitarista Oswaldo Cruz e impôs um ambicioso plano de saneamento da cidade.
A febre amarela, a malária, a varíola, a peste bubônica, o tifo, a tuberculose grassavam . Para proteger a saúde pública o projeto envolvia controvertidas medidas de controle da população e de seus hábitos de higiene. Tendo como meta controlar as epidemias organizou-se uma grande equipe de “mata-mosquitos” e uma declarada guerra aos ratos. No entanto, a medida profilática que mais revolta provocou foi tornar a vacina obrigatória, que passou a ser condição “sinequa non” para matrícula em escolas, admissão em empresas, casamentos e outras atividades. A vida social daquele que se recusasse tornar-se-ia impossível.
Na época a revolta representou um protesto contra o propósito de modernização que estava em curso e, a longo prazo redundou na elevação do padrão de vida da população, principalmente do segmento mais pobre.
Foi um gesto intimorato do presidente Rodrigues Alves, coordenado pelo médico sanitarista Oswaldo Cruz. A esses homens de visão, dispostos a enfrentar uma oposição ferrenha, o Brasil agradece e tem um débito de gratidão eterno.
O simples fato de se tornar imperioso o debate atual sobre a polêmica vacina obrigatória representa uma derrota. Da ciência. Da humanidade. O fato de estarmos em risco de perder conquistas civilizatórias por comportamentos irresponsáveis e obscurantistas nos direciona a reagir ao perigo de andar para trás, para 116 anos de retrocesso. Já aconteceu antes, não pode se repetir. Não permitamos que ocorra o abandono da ciência com prevalência da ignorância.
Não enveredemos pelas tortuosas trilhas que conduzem ao lugar nenhum, lindeiro do debacle.
No Brasil, na Europa, nos Estados Unidos, os “antiwaxxers”, como são chamados por lá, vão ganhando proeminência paulatinamente nos últimos anos, apoiados em artigos científicos fraudados e de péssima qualidade. Infelizmente, é um movimento que ameaça ganhar forças no Brasil.
Em 1904 a campanha “Ninguém Pode Obrigar Ninguém a Tomar Vacina” foi catastrófica, não permitamos a reprise de uma campanha não só contra a vacina obrigatória, mas contra a própria vacina. Abracemos a solução que surge para estancar uma hecatombe com óbitos já perto de 200 mil vítimas no cômputo oficial, sabidamente subnotificado. Ninguém pode prever o quanto nos dizimará.
A solerte campanha estigmatizará quem a divulga. As vítimas, seus familiares e a nação horrorizada jamais perdoarão.
Jayme José de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado