Votos de ano novo – Jayme José de Oliveira
Tornou-se um hábito universal na virada do ano distribuir votos, os mais diversos e assumir intenções de mudar hábitos que consideramos possíveis de melhora, esses, na maioria dos casos, tão efêmeros como o espocar dos fogos e o borbulhar dos espumantes.
Sérgio Jockymann (Palmeiras das Missões, 29 de abril de 1.930 – 16 de fevereiro d 2.011) foi jornalista, poeta e dramaturgo. Seu pai, um engenheiro agrônomo e farmacêutico, e sua mãe, professora primária, tiveram uma forte influência para nele despertar o gosto pela literatura. Em minha opinião, uma das mais fulgurantes penas que abrilhantaram o jornalismo gaúcho. Merece a reprodução desta obra-prima, um primor de concisão, bom senso e oportunidade.
“Pois, desejo que você ame e que amando, seja também amado, e quando não o for, seja breve em esquecer e esquecendo não guarde mágoa. Desejo depois que não seja só, mas se for, seja sem desesperar.
Desejo também que tenha amigos e que, mesmo maus e inconsequentes, sejam corajosos e fiéis e que em pelo menos um deles possa confiar, que confiando, não duvide de sua confiança.
E porque a vida é assim, desejo que tenha inimigos, nem muitos nem poucos, mas na medida exata para que, algumas vezes, você se interpele a respeito de suas próprias certezas. E que entre eles haja pelo menos um que seja justo, para que você não se sinta demasiado seguro.
Desejo depois, que você seja útil, não insubstituivelmente útil, mas razoavelmente útil. E que nos maus momentos, quando não restar mais nada, essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.
Desejo ainda que você seja tolerante, mas não com os que erram pouco, porque isso é fácil, mas com aqueles que erram muito e irremediavelmente, e que essa tolerância não se transforme em aplauso nem em permissibilidade, para que assim fazendo um bom uso dela, você dê também um exemplo para os outros.
Desejo que você, sendo jovem, não amadureça cedo demais e que, sendo maduro não insista em rejuvenescer, e que sendo velho, não se dedique a se desesperar. Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e é preciso deixar que eles escorram dentro de nós.
Desejo, por final, que você seja triste, mas não o ano todo, nem um mês e muito menos uma semana, mas apenas por um dia. Mas que nesse dia de tristeza, você descubra que o riso diário é bom, o riso habitual é insosso e o riso constante é insano.
Desejo que você descubra com o máximo de urgência, acima e a despeito de tudo, talvez agora mesmo, mas se isso for impossível, amanhã de manhã, que existem oprimidos, injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta porque seu pai aceitou estar com eles. E que eles continuarão à volta de seus filhos, se você achar a convivência inevitável.
Desejo ainda que você afague um gato, que alimente um cão e ouça pelo menos um joão-de-barro erguer triunfante seu canto matinal. Porque você assim se sentirá bem por nada.
Desejo também que você plante uma semente, por mais ridícula que seja, e acompanhe seu crescimento dia-a-dia, para que você saiba de quantas vidas é feita uma árvore.
Desejo outrossim que você tenha dinheiro, porque é preciso ser prático. E que, pelo menos uma vez por ano, você ponha uma porção dele na sua frente e diga: Isso é meu. Só para que fique bem claro quem é o dono de quem.
Desejo ainda que você seja frugal, não inteiramente frugal, não obcecadamente frugal. Mas que essa frugalidade não o impeça de abusar quando esse abuso se impõe.
Desejo também que nenhum de seus afetos morra, por ele e por você, mas que se ele morrer, você possa chorar sem se lamentar, sofrer sem se culpar.
Desejo por fim, que sendo mulher você tenha um bom homem, e que sendo homem tenha uma boa mulher. E que se amem hoje, amanhã, depois, no dia seguinte, mais uma vez, e novamente, de agora até o próximo ano acabar, e que quando estiverem exaustos e sorridentes, ainda tenham amor para recomeçar. E se tudo isso acontecer, não tenho mais nada a desejar.”
SHOW DE DANÇAS E LUZES – 3 min26seg
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