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Uma cena , amor e carinho – Silma Terra

Uma cena , amor e carinho - Silma TerraCOLUNA COTIDIANO

UMA CENA, AMOR E CARINHO

Tem dias que acordo bem, outros nem tanto. O tratamento é meio sem entendimento, e nem quero. Nunca ousei querer entender mais que os meus médicos. Acredito que em muitos casos a ignorância é sabia.

Há 15 anos quando tive câncer a primeira vez nada me impedia de viver a vida intensamente, somente nos dias após a quimioterapia. Sentia-me enjoada então preferia minha reclusão. Nos outros dias a vida pulsava, pujante, energizante.

E eu vivia à pleno, dirigia, passeava, tudo era sem limites,  queria mais era viver à cada dia, sem barreiras, sem fronteiras. Vida vibrante, complexa, urgente e emergente, cheia de elementos de vida presente.

Há um ano quando do diagnóstico do câncer ósseo, estacionei. Fixei-me forçadamente. Junto a dores lancinantes meu raciocínio cambaleava. Sentia vontade de voar como águia, mas não sabia como fazer. Estagnada, meus prováveis e improváveis planos e projetos, foram obrigados   a dar um tempo. Mas ainda viria algo que somando-se ao meu drama se tornaria um drama maior ainda.

Conhecemos a pandemia, de um vírus Corona, a doença Covid19 que me encarcerou,  sem ter cometido nenhum crime. Ao mesmo tempo que me encarcerou, libertou meus pensamentos, antes reprimidos pela correria do dia a dia e a desculpa da falta de tempo.

Meu território ficou minúsculo, o que me proporcionou ver minúcias.

Saí da cama tarde como sempre e ao ir para cozinha me deparei com uma cena simples, talvez corriqueira que me fez ficar emocionada. Puxei a cadeira, sentei e chorei. Entre lágrimas meus pensamentos foram para os meus talvez 3 anos de idade, quando perdemos um irmão, o Nelson de apenas 24 dias. Meu irmão, conhecido por Pelé e eu começamos a pedir para nossos pais outro bebê, para substituir o que partira.  Um dia narrarei este  momento triste.

A minha irmã Selma veio para substituir nosso irmão. A lembrança mais remota que tenho dela é correndo de fraldas e calça plástica pela casa num dia de verão. Uma criança e seu belo viver, a doçura do sorriso, a delicadeza em seus olhos que precisa ser apreciada, que traz uma alegria e turbilhão de emoções aos nossos corações.

A vida seguiu seu curso, casamos, cada uma levou a sua vida. Nossos filhos nasceram, os encontros não eram diários, mas sabíamos que a outra estava ali. Seguimos pelos trilhos da vida, e nós como passageiros desse trem. A nascermos entramos no trem, ele parte da estação. Podemos trocar de trem, nos distanciarmos, mas ele jamais para, segue firme nos trilhos da vida. Nos dá o maior presente quando temos a oportunidade de aprender, a sabedoria.

Com a sabedoria vem a maturidade, onde as dores são mais leves, até nosso coração pulsa mais suave.

Sentada, chorando passei as mãos em cada objeto exposto ali, que para mim é de grande significado..

Lá estavam a toalha, a xícara com a colher, a faca, a fruta no prato para que eu quando levantasse tivesse o mínimo de trabalho para tomar meu café matinal.

Uma mesa posta, simples, sim, de grande significados.

A vida está sempre pregando peças na gente. Eu que sempre fui uma mulher independente e dinâmica, hoje estou enclausurada dentro de casa e não só pela pandemia.

Jamais imaginei que hoje estaria dividindo um apartamento com minha irmã, a irmã que pedi para meus pais, em substituição ao bebê que havíamos perdido.

Uma mesa que significa cuidado, amor, preocupação, empatia.

Como disse, há dias que acordo  com mais dores, incomodam muito apesar da medicação, quanto menos eu me movimentar, menos é o sofrimento. Um ajudar para vestir as meias, a bolsa de água quente na cama.

Ao irmos dormir, sempre diz, qualquer coisa chama, ao sair para o trabalho espia no quarto se já acordei e como passei a noite.

Mas o que trouxe tamanha emoção?

O fato de nunca precisar de cuidados assim?

Acredito que tenha sido o sabor de me sentir cuidada. Sentir o sabor da atitude, o carinho, o desvelo. Eu nunca precisei de cuidados assim, por tanto tempo. No fundo de minh’alma busco explicações para tamanha emoção e sinto que  foi a quebra do sentimento orgulho, nascer a humildade. Nunca fui soberba, e depois que fiquei doente recebi os maiores  gestos e atitudes de amor. Humildade não perversa, mas a humildade de aceitar que preciso e recebo com amor e carinho por que me foi dado com mais amor e carinho ainda. Há quase um ano eu recebo isso diariamente, dos meus filhos que são o ar que respiro e que não queria que passassem por este sofrimento.

Aprendi a aceitar esse cuidar, entender como é bom ser cuidada, ter quem cuide de mim. Apesar das lágrimas, senti uma sensação de pura felicidade. Penso que sempre perseguimos a felicidade, mas muitas vezes sofremos e choramos sem saber que ela está aqui bem à nossa frente.

Muito bom se sentir amada, seja pela família ou amigos. Tão bom esse sentimento que vai além da gratidão, é algo sagrado que vem de dentro e meio sem explicação.

#teatirapravida

Silma Terra

Palestrante Motivacional, comunicadora de rádio e televisão, Youtuber e  Bibliotecária de formação.

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Site- www.silmaterrapalestras.com.br

Contato – contato@silmaterrapalestras.com.br

PodCast – https://soundcloud.com/sillma-borges-therra

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