A língua portuguesa chora e sangra…

”Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela…”
Olavo Bilac, in “Língua Portuguesa”.

Numa de minhas Oficinas de Criação Literária um aluno me perguntou como poderia vir a ser um escritor? Respondi-lhe que, afora algum talento, três coisas eram fundamentais: Ler, ler e ler. Muito! Poderia não resultar num escritor, porém viria a ser um excelente e crítico leitor.

Outro indagou como as personagens de uma obra literária deveriam, quando dialogassem entre si, tratar-se: – tu ou você? Não importa! Tanta uma como outra forma estará correta e, até mesmo – hoje já se admite –, se o pronome de tratamento não concordar com a pessoa do verbo. Exemplo: – “Tu vai (ao invés de “vais”) trabalhar hoje?”, ou “Se tu souber (souberes) quem tá (está) interessado me diga (diz)!”. Muitos definem esses arranjos como “licença poética”, em favor do andamento do texto. Em se tratando de fala das personagens, tudo bem!… Porém, permitir-se ao narrador esse ”assassinato”, sou contra!

Claro que a linguagem (literária ou a do dia-a-dia) deve evoluir para a sua simplicidade e objetividade. Seria um despropósito se nos dirigíssemos a uma amiga da forma seguinte: – “Apraz-me ouvi-la palrar”, ou “Apraz-me ouvir Vossa Mercê (ou Vossemecê ou, ainda, Vosmecê) tergiversar”, quando o “Curto te ouvir” já diz tudo.

De início o pronome de respeito “Vossa Mercê” era um pronome de formalidade, mas acabou se tornando, no Brasil, em “você”, pronome de intimidade, que se usa entre iguais.

Escrever – uma obra literária ou ensaio, uma simples crônica ou coluna de jornal – é um ofício extremamente sério. Lidamos com leitores, com pessoas que, de alguma forma se mostram ávidas em saber o que pensamos através de nossa escrita. O texto deve obedecer ao nosso primeiro aprendizado: substantivos, adjetivos, advérbios, enfim, devem concordar em número, gênero e grau: – contato telefônicos; brinquedo mágicos (é crime hediondo contra a Língua Portuguesa!!!). Respeitem-se, ainda, as concordâncias nominais e verbais.

A nossa idéia deve fluir (início, meio e fim). A frase jamais poderá ser truncada, o texto não deve ser um “texto duro”.

Ao escritor deve acudir à lembrança que, do outro lado, há um leitor que, em princípio, desconhece o que realmente pretendemos expressar. Não podemos, é natural, ser permanentemente infalíveis. E, ante algum eventual equívoco gramatical de nossa parte, somos merecedores do respeito e da compreensão de nossos leitores. Ao publicarmos um livro há um longo prazo de maturação, além de sermos salvos pela revisão. Num veículo como o jornal nós próprios somos os “corregedores literários”.

Na ânsia mais do que justa de enunciar nossas idéias e opiniões aos que nos lêem, podemos, inadvertidamente, cometer alguns pecadilhos ao narrar nossas “estórias”.

Mas, entre as palavras respeito e condescendência há uma distância muito grande.

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