A poesia está viva
Meu avô paterno fora, dentre vários atributos, um músico de apurado ouvido. Certa ocasião, ao assistir à apresentação de uma orquestra européia, no velho auditório Araújo Vianna – que se localizava onde, hoje, é a Assembléia Legislativa – flagrou a nota fora do tom que o segundo violino executara. Ele era, de fato, um grande amante da bella música.
Aos doze anos, decidi iniciar o aprendizado de violão. Quando noticiei a meu avô a resolução, ele recomendara: “Cuidado! O violão é, dos instrumentos musicais, o mais fácil………… de ser mal executado”.
Nunca esqueci suas sábias palavras. Tanto é verdade que, depois daquele dia, o meu violão conquistou o seu cativo lugar: o alto do roupeiro. Metade do “braço” do instrumento ultrapassava a extensão do móvel, servindo, pois, de cabide, onde, no silêncio da hora tardia, pendurava as roupas que usara naquele dia. Por esta razão o violão fora importante em minha juvenil formação.
Hoje, posso me considerar não um expert musical; um virtuoso leitor. Obtive este aprendizado graças à Oficina de Criação Literária do escritor Luiz Antônio de Assis Brasil. Dizia, então, o mestre: “Se, ao final do curso, vocês não forem razoáveis escritores, serão, ao menos, criteriosos e seletivos leitores”.
O resultado disso é que, a exemplo de meu avô, “criei” a minha frase lapidar: “A poesia é, das categorias literárias, a mais fácil……………………. de ser mal escrita”.
O que tenho lido de “lixo” naquele gênero nos últimos tempos é desalentador. Pretensos poetas entendem que, ao executar uma ou mais rimas, “criaram” o mais belo e sublime dos poemas. Poesia é muito mais! Diferentemente do conto, da crônica e, pasmem!, do próprio romance, ela é ágil, dinâmica, mutante. Sobretudo em sua temática.
Falar de “coisas” (saudades, amor perdido, traição, morte) que milhões já falaram é cair no lugar comum. Somente aos talentosos é permitido ingressas neste universo movediço. Hoje, mais do que talento faz-se fundamental conhecer o vocabulário.
Foi com grata surpresa, pois, que li ”Considerações Pré-maturas & Outras Ausências”, de Delalves Costa, jovem poeta, natural, como ele próprio diz, de Maquine (e de Osório, onde reside). Sim, grata surpresa, pois acalenta-nos, leitores, de que nem tudo está perdido, e de que – apesar de alguns “rimadores” de plantão – há promessas de riqueza vocabular e, sobretudo, poesia sob o sol do Litoral Norte.
Portanto, ele está aí. E quem consegue, em poucas palavras, “pintar” uma tela tão rica, deve, sim, ser (re)conhecido como poeta. Eis o excerto de “O Homem Sono em Claro”, um dos poemas que compõem aquele pequeno livro.
“Amanheço. Os dias são mal-dormidos
no calcanhar das noites
– roem lágrimas
nas ruas do tempo.”