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O indelével estigma

Quem, da minha geração, não há de se lembrar da magia – para nós, que recém entrávamos na adolescência – que foram ofinal da década de cinquenta e a primeira metade da de sessenta? Eram, como ficariam marcados nas nossas fantasias, os inesquecíveis Anos Dourados.

Não havia sábado, mesmo no mais recôndito bairro da mais longínqua cidade em que não houvesse um iluminado salão de clube, o romantismo das músicas das grandes orquestras, dos conjuntos melódicos ou, até mesmo, a mais simples das reuniões dançantes na sala de uma casa onde sofás e mesas eram afastados ou retirados para outros cômodos paraque os sons, vindos de uma pequena e esforçada, vitrola embalassem os sonhos daquela juventude. A apoteose disso tudo se cristalizava nos bailes de debutantes.

Vem-me à lembrança uma pequena, no entanto promissora, aldeia em que o presidente do único e modesto clube resolvera realizar um baile de debutantes. Seria, para o dirigente, a oportunidade de ouro para seu patusco filho aproximar-se e conquistar o coração da mais bela e virginal adolescente da região.

O clube, sabidamente, passava por dificuldades: as tábuas do piso do salão estavam empenadas, as cadeiras com assentos de palha desgastados, as toalhas das mesas puídas e desbotadas, a fiação elétrica a céu aberto, a copa e cozinha desprovida de higiênicos balcões e geladeira.

O presidente reuniu-se com tesoureiro do clube e, juntos, tramaram, com os principais fornecedores das redondezas e até mesmo da capital a transformação não apenas do salão de baile, a sede toda com luxuosas dependências. As despesas seriam pagas pelos ingressos superfaturados a serem cobrados dos associados. Afinal, tão cedo em suas vidas não mais veriam um acontecimento com tamanha grandeza e luzes.

O pai presidente e o bronco filho já viam a conquista da bela e glamorosa debutante como favas contadas.Jamais supunham, entretanto, a presença de um imponente e jovem forasteiro que ali aportara ao volante de um flamante automóvel Mercedes Benz.

Alto, loiro, olhos azuis, os ombros que se salientavam no elegante smoking, impossível não ser notado, o rapaz, na primeira valsa entoada, convidarapara a contradança a mais bela da festa. Bailaram sete e inesquecíveis canções, o suficiente para serem vistos embarcando no bólido e, numa nuvem de poeira, sumirem para nunca mais serem vistos.

Ainda me pergunto por que, na madrugada desta quarta-feira, 9 de julho, acordei-me para escrever esta história.

Sim, por quê?

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