Agosto - I - Litoralmania ®
Colunistas

Agosto – I

…lentamente, despiu-se e apanhou o pijama
de listas sob o travesseiro…

A situação é grave, muito grave – disse o ministro da guerra, zenóbio da costa, ante as notícias que lhe foram comunicadas pelo marechal mascarenhas de morais, a pedido dos militares em assembleia no clube da aeronáutica. Numa reunião que durou doze horas, todos os brigadeiros do ar presentes no rio de janeiro decidiram, por unanimidade, que somente a renúncia do presidente vargas seria capaz de restaurar a tranquilidade ao país. O marechal pôde claramente perceber na voz de vargas mais do que desafio. Havia tristeza e desgosto na fala do presidente, Não renunciarei. Fui eleito pelo povo e não posso sair enxotado pelas forças armadas. Só sairei daqui morto.

Major taurino acompanhava o desenrolar dos acontecimentos na voz de eron domingues, o repórter esso. A indignação do major não apenas era visível pelo seu semblante. Havia revolta no tom de sua voz,  Aquela cambada de ordinários se esquece que o “baixinho” é mui macho! Bem se vê que não aprenderam ainda quem o gaúcho é! Pra liquidar essa pendenga, só no tiro, mesmo!

Eram onze horas da noite de 23 de agosto de mil novecentos e cinquenta e quatro quando o general zenóbio pediu ao marechal mascarenhas para ir ao ministério da guerra. A situação se agravara. Mais de quarenta generais do exército subscreveram o manifesto dos brigadeiros. Juntos, se dirigiram ao palácio do catete. Mascarenhas propôs ao presidente uma reunião imediata com todos os ministros de Estado. Pouco depois das duas da madrugada, à exceção do ministro das relações exteriores, todos se fizeram presentes. Com a voz abatida, o presidente relatou as notícias que seus chefes militares haviam transmitido e pediu a opinião dos presentes. Os ministros militares aconselharam a renúncia. O presidente pediu então aos ministros civis que opinassem. Oswaldo aranha e josé américo seguiram as opiniões dos ministros militares. Hugo de faria disse que a constituição deveria ser respeitada e mantida, que o presidente não renunciasse. Os outros ficaram vacilantes, nenhum deles manifestou-se objetivamente. Todos começaram a falar em voz alta ao mesmo tempo. Num último esforço, vargas tomou a palavra e disse que se os ministros militares garantissem que as instituições fossem mantidas ele se licenciaria. Tancredo neves, ministro da justiça, ficou encarregado de redigir a nota expressando a decisão presidencial de entrar em licença passando o governo a seu substituto legal, o vice café filho. Depois, o presidente retirou-se e subiu para o seu quarto, no terceiro andar. Sozinho, vargas, lentamente, despiu-se e apanhou o pijama de listas sob o travesseiro. Vestiu-o. Apagou a luz, deitou-se.

No alvorecer do dia 28 de agosto daquele mesmo ano, o coronel joão moraes pereyra desencarnou. Neste instante, parou de chover. As nuvens deixaram-se desvirginar pelos primeiros raios de sol, após um verdadeiro dilúvio de quatro meses. Santherminia finalmente resgatava o seu perfil de povoado que flutuava no calor, impondo seus moradores, após o almoço, a estenderem as redes nos pátios, à sombra dos laranjais. Ao velório do coronel, mesmo o prefeito e os edis, iriam somente após a sesta.

Frei marcelino ingracio d’arisbo, a partir daí, passou, verdadeiramente, a conhecer o povoado e a gente com quem viveria o resto de seus dias.

Comentários

Comentários