Bebê de Torres é o primeiro a receber no RS tratamento que custa R$ 12 milhões
Em época de renovar as esperanças, essa expressão virou algo concreto para uma família de Torres. Ísis Mariana Cardoso Labres, de um ano e quatro meses, foi a primeira paciente no Rio Grande do Sul a receber terapia gênica para tratamento de Atrofia Muscular Espinhal (AME). A bebê tem AME – Tipo 1, considerada a mais grave.
O procedimento foi realizado em dezembro, na semana do Natal, no Hospital Moinhos de Vento, e a menina já está em casa e bem.
Antes, porém, de a criança ser sorteada em programa assistencial e de conseguir gratuitamente o primeiro tratamento no Hospital Moinhos de Vento, na Capital, os pais travaram uma batalha para obter verbas para ir aos Estados Unidos e dar esperança de vida para a filha. O tratamento custa em torno de R$ 12 milhões.
A médica geneticista Elizabeth Silveira Lucas explica que a Atrofia Muscular Espinhal é uma doença genética rara na qual a criança não possui ou possui baixos níveis da proteína SMN, responsável por manter os neurônios motores saudáveis e que possibilita os movimentos.
Essa alteração faz com que pacientes com AME – Tipo 1 tenham fraqueza muscular progressiva, inclusive da musculatura do aparelho respiratório. Normalmente, a evolução da doença faz com que necessitem de ventilação mecânica e pode provocar a morte por falência respiratória.
“A nova medicação deve ser aplicada antes dos dois anos de idade. A terapia utiliza um vetor viral inofensivo para humanos que, ao ser injetado no organismo, leva o gene responsável pela produção da proteína para dentro das células. A expectativa é que com uma única aplicação, seja possível “corrigir” o gene e fazer com que a criança passe a produzir corretamente a proteína para que os neurônios motores funcionem normalmente”, acrescenta Elizabeth.
No ano passado, a instituição iniciou o processo para se habilitar a realizar a terapia gênica. A paciente passou por avaliações para que o tratamento fosse possível. Equipes médicas, farmacêuticas e de enfermagem foram treinadas para realizar o procedimento. A menina foi randomizada em setembro pelo laboratório Novartis para receber o tratamento sem custo – a iniciativa faz parte de um Programa Assistencial de Acesso Expandido. O Hospital Moinhos de Vento custeou todas as despesas médicas, assistenciais e hospitalares.
O superintendente médico da instituição, Luiz Antonio Nasi, ressalta o passo importante para a medicina do Rio Grande do Sul. “Decidimos priorizar a atuação no tratamento de doenças raras com terapia gênica, buscando o desenvolvimento contínuo da complexidade das nossas práticas médicas. No caso da Ísis, toda preparação e treinamento nos coloca como uma referência para aplicação da terapia gênica na América Latina”, destaca Nasi.
O procedimento
Mais de 30 profissionais se envolveram no tratamento, especialmente médicos, farmacêuticos, enfermeiros e técnicos em enfermagem. A equipe da UTI Pediátrica passou por treinamento para atuar no procedimento.
Segundo o chefe do Serviço de Pediatria do Hospital Moinhos de Vento, João Ronaldo Krauzer, ela recebeu a medicação, ficou em observação por cinco horas e depois foi liberada, sem necessidade de internação. “Ela tem outros procedimentos que serão feitos, porque vai demorar um pouco para que retome todas as suas funções, como a deglutição”, pontua Krauzer.
Por ser uma situação muito especial, foi permitida a permanência dos pais na UTI. A médica geneticista ressalta que, a partir de agora, Ísis permanece cinco anos em acompanhamento para que sua evolução possa ser avaliada. Pelo menos durante o primeiro mês após a terapia gênica, ela continuará sendo medicada para evitar possíveis efeitos colaterais.
O caso
A paciente foi diagnosticada com AME aos quatro meses de idade. Com sete meses, Ísis teve pneumonia e os médicos iniciaram o tratamento com um medicamento para estabilizar o quadro dela. A rotina de consultas e infusões chegou a exigir que a mãe, Larissa Cardoso, trouxesse a filha a Porto Alegre de quatro a cinco vezes por semana. “Depois do nascimento dela, nunca voltei a trabalhar. Me dedico exclusivamente às minhas duas filhas”, conta.
A irmã, Ana Clara, tem três anos e, quando não fica com uma das avós, acompanha a família nas consultas. O pai, Mateus Labres, divide-se entre o trabalho como barbeiro e os cuidados com as meninas. O fim de ano da família foi com o melhor presente que eles poderiam imaginar. “Eu ainda não acredito! É como se ela tivesse nascido de novo!”, declara a mãe.
Alegria compartilhada com a equipe do Hospital Moinhos de Vento. “Para quem é médico, que tem essa missão de salvar vidas, não há sentimento melhor. Foi o nosso presentão de Natal!”, conclui a médica Elizabeth.