Cassados prefeito e vice de Cidreira
Desta decisão cabe recurso.
Veja abaixo a sentença na íntegra.
Sentença em 02/04/2013 – RP Nº 130047 Dr. EMERSON SILVEIRA MOTA
SENTENÇA
1. Trata-se de representação ajuizada pelo PTB de Cidreira contra os candidatos MILTON TERRA BUENO e CLÁUDIO VOLF, como incursos no art. 41-A da Lei 9.504/97, por captação ilícita de sufrágio quanto a 6 pessoas, com doações, ajudas e dinheiro, em troca de votos, da seguinte forma: 1º) LUIZ CARLOS DOS SANTOS teria recebido de Milton Bueno 15 metros de piso e R$ 50,00 em gasolina, e de Cláudio Volf, a quantia de R$ 200,00; 2º) ROSICLER CORREA teria recebido de Cláudio Volf a quantia de R$ 300,00; 3º) TAMARA ISABEL PONTES NOGUEIRA teria recebido de Cláudio Volf um botijão de gás e a quantia de R$ 100,00; 4º) CAROLINA RAQUEL DA SILVEIRA teria recebido de Milton Bueno uma cesta básica e um botijão de gás; 5º) “MIONI” teria recebido dos representados uma casa; 6º) “VANDA” teria recebido dos representados R$ 2.000,00 em dinheiro. A inicial também relatou contexto de irregularidades em transferências de títulos eleitorais com o fim de captação de votos. Pediu a cassação dos mandatos dos representados, com sanção de inelegibilidade e pena pecuniária entre 1.000 e 5.000 UFIRs.
Notificados, os representados contestaram, alegando ilegitimidade ativa do partido representante. No mérito, sustentaram que as acusações são genéricas e inverídicas, pugnando pela improcedência.
Houve audiência para a oitiva das testemunhas das partes.
Considerando que a RBS não cumpriu a determinação judicial (requerida pela parte autora) de fornecer a íntegra das gravações (sem cortes ou edições) que geraram a matéria jornalística que denunciou publicamente compras de votos em Cidreira (5º e 6º supra), procedeu-se a oitiva das envolvidas.
Após a audiência, a instrução foi encerrada, concedendo-se prazos sucessivos de 10 dias às partes e ao MP para manifestações.
Em memoriais, a parte autora sustentou que foram comprovadas seis compras de votos, postulando a procedência da ação.
A defesa, por seu turno, reiterou a preliminar de ilegitimidade ativa. No mérito, sustentou a insuficiência de provas das acusações, originadas por apoiadores de Custódia, candidata derrotada do PTB.
O MPE manifestou-se pela procedência da ação.
É o relatório.
2. A preliminar de ilegitimidade ativa já foi afastada conforme decisão da fl. 115, razão pela qual não há necessidade de repetir a análise do que já foi decidido.
3. Dos fatos denunciados, apenas um restou comprovado, o que é suficiente para a procedência da representação.
Trata-se do 1º fato, onde a testemunha LUIZ CARLOS DOS SANTOS confirmou ter recebido dos representados doação e dinheiro mediante pedido de votos (fl. 219). Em um primeiro momento, recebeu 15m de piso e R$ 50,00, dados por Milton Bueno e Beto Pires (Prefeito na ocasião). Mais adiante disse que Milton esteve na sua casa, com mais duas pessoas, dentre elas Cláudio Volf, ocasião em que recebeu mais R$ 200,00, sendo que houve pedido para que 5 pessoas da sua família votassem nele (fl. 219). Não se vislumbra motivo para descredibilizar esta testemunha, devidamente compromissada. Percebe-se que se trata de pessoa humilde, que apresentou versão coerente com a sua situação, e não se demonstrou qualquer vínculo com campanha em prol do partido ora representante. Logo, seu testemunho serve como prova segura da ocorrência da infração.
Por outro lado, quanto aos demais fatos, não há provas suficientes.
O 2º fato, envolvendo ROSICLER CORREA, não restou devidamente comprovado. Ninguém presenciou a oferta de R$ 300,00, ou ela recebendo o valor. Não há qualquer outra prova ou documento deste fato. Tudo que se tem é o depoimento de Rosicler, mas que, ao contrário do fato anterior, não serve, por si só, como prova – pois foi ouvida apenas como informante (não como testemunha compromissada), por ter trabalhado na campanha de candidatos do partido representante. Sua suspeita é evidente, na medida em que possui interesse direto na procedência desta ação.
No tocante ao 3º e 4º fatos, envolvendo TAMARA ISABEL PONTES NOGUEIRA e CAROLINA RAQUEL DA SILVEIRA, nenhuma prova veio aos autos em juízo. As supostas envolvidas não foram trazidas para prestar depoimentos. Sequer foram arroladas na inicial. Nenhuma das pessoas ouvidas disse ter presenciado elas recebendo proposta ou alguma vantagem dos representados. Tudo o que se tem é a notícia inicial, suficiente apenas para o recebimento da representação, mas insuficiente para a sua procedência quanto ao ponto, por ausência total de confirmação destes fatos perante o juízo.
Da mesma forma, insuficiente a prova quanto ao 5º e 6º fatos, envolvendo Mioni Odete da Silva (“MIONI”) e Vanderlete Oliveira (“VANDA”). Inicialmente, elas foram flagradas em uma matéria jornalistica da RBS, supostamente como sendo pessoas que receberam dos representados vantagens (uma casa, a primeira, e R$ 2.000,00 a segunda), em troca de votos.
A defesa sustenta que houve armação e montagem, onde pessoas ligadas ao partido ora representante teriam induzido as duas mulheres às respostas apresentadas, diante do contexto criado.
De fato, a matéria exibida na televisão contém cortes de edição, com supressão de pontos fundamentais para a análise da infração. Cito, como exemplo, o trecho em que é perguntado à Sra. Mioni se ela teria recebido a casa em troca de votos, sendo que, no lugar da resposta, há um inexplicável silêncio (?!).
Atento a isso, o próprio PTB, autor da ação, desde o início postulou a requisição da íntegra do material gravado, para que se pudesse analisar a totalidade dos diálogos. Mas, lamentavelmente, a RBS não forneceu este material – indispensável pelo contexto processual que se instaurou a partir da alegação defensiva de que houve montagem e indução.
Então, este juízo determinou a oitiva das envolvidas (as quais não foram trazidas inicialmente pelas partes).
Ouvidas, as duas senhoras negaram taxativamente o recebimento de qualquer vantagem dos candidatos. Mioni sustentou que a casa foi construída com ajuda do filho e do patrão, em terreno doado por Custódia (anterior prefeita); e Vanderlete alegou que tudo não passou de uma “pegadinha”.
A defesa trouxe documentos que confirmam a alegada origem da casa (docs. das fls. 297/306), excluindo os representados.
Por outro lado, sustenta o MP que a imagem captada diretamente pelo interlocutor pode ser usada como meio de prova. No entanto, o caso dos autos apresenta uma peculiaridade que não permite enquadramento nesta regra, qual seja: as imagens não foram publicadas nem apresentadas na integralidade. A matéria jornalística foi cortada e editada. Nestas condições, por si só, não tem valor como prova, mas apenas como mera notícia (aliás, esta era a sua finalidade).
Em termos de prova testemunhal, o processo é precário. Quase todas as testemunhas ouvidas tem vinculação partidária. Aqui reside o maior problema quanto à origem destes fatos. As conversas, na reportagem, não foram realizadas diretamente com o repórter da RBS, mas sim com duas pessoas intimamente ligadas aos interesse políticos do partido ora requerente. São elas: Enilda Ferreira Saraiva e Devalcir Echeverria Brião, ambos candidatos à vereador pela coligação que apoiava a candidatura de Custódia, pelo PTB. É evidente que os relatos destas pessoas é totalmente suspeito, pelo interesse pessoal e partidário na cassação dos representados. Assim, a participação destas pessoas como interlocutoras nas imagens captadas, conduzindo os diálogos, macula a origem do episódio, não se podendo descartar a possibilidade cogitada pela defesa de montagem, porquanto possuem motivo para produzir notícia tendenciosa para, com ela, embasar um processo contra adversário político.
No mesmo sentido, as demais testemunhas do representante, Ricardo Correa da Silva e Flávio Ferraz, que nada presenciaram quanto a estes fatos, também são suspeitos por vinculação política com o autor da causa (o primeiro é presidente do partido coligado e o outro trabalhou na campanha da adversária dos réus). Logo, seus relatos também não servem como prova.
De tudo, sobrou apenas as declarações de Mioni e Vanderlete, em momentos distintos, e ambos em circunstâncias dúbias. Entretanto, quando pessoas prestam relatos diversos e antagônicos sobre o mesmo fato, não se pode escolher qual das versões é a “melhor”, pois não se tem elementos suficientes para afirmar em qual momento falaram a verdade. A única solução juridicamente viável é não dar credibilidade a nenhum dos relatos.
Embora haja suspeita de que os representados tenham comprado os votos destas pessoas, não se tem a certeza indispensável para afirmar que isso realmente tenha ocorrido.
Quando às irregularidades de transferências de títulos eleitorais e transporte de eleitores, nada veio aos autos deste processo. Salienta-se que se trata de situação já sob apuração da Polícia Federal em inquérito próprio.
Considerando que para o enquadramento nas sanções do art. 41-A da Lei 9.504 basta apenas a ocorrência de uma conduta vedada, tenho que o primeiro fato descrito na representação, o qual foi devidamente comprovado, é suficiente para caracterizar a infração eleitoral, e embasar a procedência da representação.
Por fim, os fatos noticiados neste expediente configuram crimes de corrupção eleitoral ativa e passiva, impondo-se a remessa de cópia de todo o processo para a Polícia Federal para a apuração na esfera penal.
3. ANTE O EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE A REPRESENTAÇÃO, aplicando aos representados, MILTON TERRA BUENO e CLÁUDIO VOLF, a multa de hum mil UFIRs para cada, por infração ao art. 41, “A”, da Lei 9.504/97, determinando a cassação dos seus diplomas, nos termos do mesmo artigo.
Registre-se. Publique-se. Intime-se.
TRAMANDAI, 02 de abril de 2013.
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Emerson Silveira Mota