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O homem unificado

Ainda contabilizo os títulos que me foram gatunados pelos empregados da empresa de mudanças quando fixei residência em Capão, há cinco anos. Devem estar próximo dos quinhentos livros.

Nos últimos dias de abril, terminei a leitura de “Caim” e, com ela, a constatação do “extravio” de “História do Cerco de Lisboa” (1989) e de “O Homem Duplicado” (2001), todos do escritor José Saramago – Nobel de Literatura em 1998 –, morto no dia 17 de junho último, aos 87 anos de idade. “Caim” foi o último romance do autor lusitano.

Ainda que Saramago tenha se revelado um escritor temporão, suas obras fixaram um divisor de águas, não apenas na literatura portuguesa, como também na literatura universal. Polêmico, assumidamente ateu e comunista, ele se viu, em 1991, impedido de concorrer a prêmio literário ante a forte pressão da comunidade cristã conservadora de Portugal, em razão de seu livro “O Evangelho, Segundo Jesus Cristo”.

O ”Evangelho” é uma magnífica parábola da qual o autor se vale para contar, romanescamente, a passagem de Cristo na Terra. “Ensaio sobre a Cegueira” e “Caim” seguem nesta linha “parabólica”.

Dono de um estilo ímpar, Saramago mostra-se autor de difícil leitura. Alguns o veem como um “barroco”. A exigência, sobretudo nas edições para países de língua portuguesa, de que se mantivesse o texto no original lusitano, contribui para o perfil de seu estilo rebuscado, erudito. Mestre na técnica do diálogo inserido (o que poucos autores o conseguem com êxito), Saramago legou inestimáveis lições a quem ainda busque estilo próprio.

“O Homem Duplicado” – que juntamente com “Memorial do Covento” (1982) – recomendo leitura, mais do que um romance ou novela, me soa como uma narrativa longa: um conto! O final, extremamente surpreendente, inesperado, é um verdadeiro murro no estômago do leitor.

A contundente obra literária de José Saramago há muito conquistou a posteridade, condição única, talvez, que o autor pudesse aceitar como indelével.

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