Prevenção do Suicídio – Setembro Amarelo – Dr. Sander Fridman
* Dr. Sander Fridman – psiquiatra e psicoterapeuta. Mestre e Doutor pela UFRJ. Diretor científico do Serviço de Doenças Afetivas na Santa Casa de Porto Alegre (1981-1986), da Fridman e Tombini – Clínica das Depressões, e responsável pela Clínica das Depressões do Centro Médico Adventista Silvestre de Botafogo, Rio de Janeiro (2011-2018).
Desde 2014, de iniciativa da Associação Brasileira de Psiquiatria, do Conselho Federal de Medicina e dos Centros de Valorização da Vida, o mês de setembro tem sido destinado a campanhas de conscientização e prevenção contra os riscos do suicídio.
Um passeio pelo conjunto das publicações internacionais indexadas pela pubmed.gov, permite encontrar, entre 2016 e 2019, 584 artigos científicos com os termos prevenção e suicídio em seus títulos (195 por ano), enquanto, entre 2020 e 2023, encontramos 961 artigos (320 por ano).
Até o momento, em 2024, temos publicados 223 artigos, estimando 297 até o final do ano, ainda maior que nos anos de 2020, 2021 e 2022. Nos anos de imposição de lockdown, em resposta à covid, o interesse científico no tema da prevenção ao suicídio aumentou em 65%.
Nos últimos 4 anos, 18 metanálises foram publicadas sobre o tema. Metanálises são uma classe de estudos especialmente valorizados, pois permitem analizarem-se conjuntamente as observações reunidas a partir de diferentes estudos com objetos e modos de medir semelhantes, supostamente aumentando o poder da análise estatística para confirmar ou descartar hipóteses.
A partir do acompanhamento clínico de 29.071 pacientes, obtidos a partir de 15 estudos com diferentes tipos de intervenção, aprendemos que os métodos disponíveis foram eficazes na prevenção do suicídio tentado ou completado, tanto mais quanto mais recursos se juntam para isso – apoio comunitário, intervenções psicoterápicas e medicamentos psiquiátricos, especificamente dirigidos a este fim (Hofstra e cols, 2019, Holanda).
Um estudo de Nuij e cols, de 2021, puderam analisar integradamente as observações obtidas de 3536 casos descritas de 6 estudos análogos, com uma redução aproximada de 43% na taxa de suicídios, apenas empregando estratégias pré-definidas quando surgem idéias de suicídio.
Doupnik e cols (2020), analisando conjuntamente 14 estudos com 4270 pacientes que tentaram suicídio, observaram que uma única intervenção destinada a reduzir a inclinação imediata para o suicídio e encaminhar o paciente para tratamentos de longo prazo era capaz de reduzir as chances de uma nova tentativa em cerca de 31%.
Skopp e colegas, 2023, encontraram uma certa utilidade de acompanharem pacientes suicidas à distância ao longo de 2 anos, independente de vínculo ou compromisso terapêutico, inclusive através de cartinhas de estímulo e motivação, a partir de 6218 pacientes relatados em 6 publicações científicas.
É equivocada a ideia de que “quem realmente quer, não tenta: faz”. Várias tentativas costumam preceder um suicídio completado. Para cada tentativa, de 15-25% tenta novamente, e de 5-10% eventualmente morrerá disso. Nicoli e cols (2012), identificaram, na França, que apenas 3,4% da população tinham alguma vez tentado suicídio.
Se na Espanha não for muito diferente, onde Goñi- Sarriés e cols (2018) encontraram que 31,9% das mortes por suicídio sucederam uma tentativa prévia, vemos que este fato pode indicar que uma tentativa implica um risco 9,4 vezes maior de morte por suicídio do que na população geral.
Compare-se isto com o prognóstico de longo prazo de um infarto agudo do miocárdio (IAM), que não elevou, ao longo de 8 anos, o risco de morte por IAM, conforme Ferrannini e cols (2012), na Suécia. Uma tentativa de suicídio é um evento incomparavelmente mais perigoso, para seus sobreviventes, do que um Infarto Agudo do Miocárdio, que não acrescentou risco de morte, no longo prazo.
As pesquisas em prevenção do suicídio finalmente têm avançado como há muito se demandava.
Fatores que sabidamente aumentam o risco de suicídio incluem suicídios na família, abuso na infância, sofrimentos emocionais (como depressão, e muito pior ainda quando associada com álcool, drogas, pânico, sintomas psicóticos e sentimentos de isolamento social), e acesso a métodos potencialmente eficazes – e, principalmente, tentativas prévias.
São fatores reconhecidamente protetores tratamento efetivo dos transtornos emocionais, doenças físicas e suas complicações; promover e proteger conexões afetivas com familiares, amigos e a comunidade; ensino e apoio às habilidades de resolução de problemas (da vida) e de tensões emocionais internas e interpessoais.
Uma tentativa de suicídio aponta para a necessidade de um acompanhamento clínico cuidadoso, experiente, informado, suportivo e integrativo do ponto de vista emocional, social, espiritual, farmacológico e da saúde geral. Implica em desenvolver habilidades interpessoais e intrapessoais, e identificar e amenizar a angústia decorrente das principais fontes de angústia.
E estes cuidados devem começar imediatamente, com a participação possível de uma pessoa de confiança do paciente, apoiando o tratamento e acompanhando respeitosamente ao paciente, com as devidas orientações do profissional de saúde mental. E principalmente, seguir estes cuidados em prazo longo, até o controle dos principais fatores de risco clinicamente identificados.