Descolamento do Ibovespa, a disputa entre micro e macro
Sexta-feira, 29 de abril de 2011, 1º quadrimestre do ano concluído. Qual conclusão quanto ao mercado acionário brasileiro? Mais do mesmo! Infelizmente para uns e felizmente para outros, após momentos de euforia e angústia, o Ibovespa termina o período acumulando em 2011 desvalorização de 4,6%. Porém, estaria o Ibovespa devidamente precificado?
Olhando para os principais mercados externos, nossos benchmarks históricos, concluímos que por essa métrica o Ibovespa está atrasado e bastante! Dow Jones, principal índice acionário do mercado americano e mundial, +10,7% em 2011 e mais de 20% desde início de 2010. DAX, o Ibovespa da Alemanha, +8,7% no ano. Já o Nikkei, índice referencial do Japão acumula queda de 3,7% em 2011, mesmo tendo sofrido um dos piores terremotos já contabilizados desde que se tem informação no mundo.
Seriam então os resultados corporativos responsáveis pelo descolamento do índice local, certo? Não mesmo! Analisando as receitas das empresas que compõem o Ibovespa, as mesmas reportaram em 2010 crescimento de 22% em relação a 2009. Ok, concordo que uma coisa é vender e outra é lucrar, afinal é esse o principal motivo ao se constituir uma empresa. Então o que dizer quanto ao fato que no mesmo período, o lucro dessas empresas cresceu 55%. O que isso quer dizer então? Que em 2010 esse grupo de empresas lucraram cerca de 8x o crescimento do PIB Brasileiro, além de terem ganho muita produtividade. E o Ibovespa nesse cenário? Não notou e acumulou míseros +1,04% em 2010.
Se o Ibovespa está claramente descolado e não tem a ver com o cenário microeconômico (corporativo), então a divergência deve estar no campo macroeconômico, certo? Certo! Estamos claramente presenciando uma economia superaquecida, com inflação acima das metas do governo federal e infraestrutura sobrecarregada (portos, aeroportos e estradas). Qual é a solução clássica? Pé no freio! Como? Medidas tradicionais e macroprudenciais (não tradicionais). Ou seja, o governo federal vem aumentando compulsório e taxa de juros (e deverá continuar ao longo de 2011), elevando impostos sobre transações envolvendo investimentos estrangeiros e até mesmo o cartão de crédito dos viajantes brasileiros foi impactado. Compras no cartão de crédito no exterior ficaram mais caras, caso ainda não saiba, o IOF passou de 2,4% para 6,4%.
Destrinchando a discussão, acredito que novas medidas macroprudencias podem vir, apesar da Ata do Copom dessa semana deixar clara a redução do uso dessa ferramenta. Porém é exatamente essa incerteza e divergência de opiniões que faz o investidor estrangeiro ter receios de investir no Brasil. Só para se ter ideia, nos primeiros 4 meses de 2011 já saíram mais de R$ 3 bilhões da BM&FBovespa, metade de tudo que entrou nos 12 meses de 2010.
Nesse cabo de guerra entre o cenário microeconômico e macroeconômico, o segundo vem claramente prevalecendo, caso contrário o Ibovespa já teria ultrapassado a casa dos 80 mil pontos. Mais e aí, qual a solução? Infelizmente a resposta não é simples. Elevação na taxa de juros por aqui e nos Estados Unidos, deterioração na Europa e freio na China, todos esses possíveis cenários vem em cheio impactar o mercado acionário e econômico brasileiro.
Ainda assim, em meio a todas as incertezas que cercam o Ibovespa, o passado prova que mercados acionários vivem em ciclos e algum momento o atual deixará de ser baixista/estacionário para altista. Como as empresas brasileiras não param de reportar lucros recordes (vide resultados de 2010 e dessa semana do Bradesco, Santander, Lojas Renner) sigo posicionado em ações e para falar a verdade bastante tranquilo, se os ganhos não vierem por valorização das ações, que sejam pelos dividendos, afinal de contas, lucro é lucro!
Gustavo Pires
Área de Análise da XP Investimentos