Pompa e a circunstância
Para mim, uma das grandes bizarrices é a toga. Nada mais arcaico do que o julgador vestir toga para decidir se a um cidadão é devido o serão no dia de domingo.
Fico imaginando convencer, por exemplo, um canadense de que no Brasil existem homens de toga que se reúnem, amiúde, à custa do dinheiro público, para julgarem se é válido o trabalho após o expediente normal. Suponho que seria tarefa impossível de alcançar.
E existe a pompa na rua onde a autoridade é recebida com tapete vermelho estendido e rufo de tambores e, depois, ao som do hino, ergue o pavilhão nacional.
Há a pompa do “abre-alas”, reservada aos governantes do primeiro escalão. É quando saem pelas ruas com o séquito de seguranças. Os “batedores”, com potentes motocicletas, vão abrindo caminho. O trânsito para, e que se dane o resto – que saiam da frente! Abrem-se os caminhos, porque lá vai algum governador, ministro de estado ou presidente da república.
Pois no início desta semana a senhora presidente desceu em Porto Alegre, de inopino, ao cair da tarde, aumentando o furor do enlouquecido trânsito da cidade. Na pressa irrefletida de abrir caminho à passagem da ilustre senhora, um batedor que seguia o cortejo bateu, violentamente, em outro veículo. O soldado ficou gravemente ferido e uma criança de um ano, que estava em outro veículo envolvido, foi levada ao Pronto Socorro.
Os jornais nada informaram se a mandatária parou para prestar alguma assistência às vítimas, ou tenha manifestado algum constrangimento pelo o que ocorreu. Mas, pensando bem, nem poderia. Afinal, a frieza da pompa e da circunstância não permite a quebra do rígido protocolo de segurança, principalmente, para demonstração de gestos de solidariedade com o semelhante.