Cachorrão não larga o osso

Meses após o episódio das provas do “Artigo 99”, narrada na crônica anterior, Zabanetta Noronha e Barbosa jogavam futebol de salão nas quadras do Colégio São Pedro.

Em meio ao jogo, na arquibancada quase vazia, apareceu, de súbito, meio fantasmagórica, a figura do Cachorrão: alto, magro, loiro, melena penteada para trás, dura de Gumex.

Óculos escuros (mesmo à noite), não havia razão para estar no ginásio àquela hora, salvo assistir à partida pela qual, entretanto, demonstrava absoluto desinteresse. A certa altura, num canto do ginásio, alheio ao jogo, começou a cavoucar o nariz de forma repulsiva.

Alertado por Barbosa da abjeta figura, por vez ou outra, no transcorrer do jogo, de dentro da quadra, no momento em que o irmão se distraia a olhar em outra direção, Zabanetta bradava, em alto e bom som:

— Cachorrão! Cachorrão!

O prelado, impassível, parecia nada ouvir.

No final do jogo, o irmão foi ao vestiário. Parando ao lado de Zabanetta, acusando ter escutado os gritos a ofendê-lo, em voz baixa, ao pé do ouvido, com carregado sotaque alemão da colônia, advertiu a Zabanetta:

— O fia da p… que me chamou de Cachoron, non precisa butá os pé aqui dentro do Colégio São Pedro, ouviu?

À advertência nada dissera Zabanetta. Este continuou a trocar o fardamento. Entretanto, na saída, já à porta, Zabanetta virou-se e, com a força pulmonar que podia imprimir, gritou para dentro do Colégio cujo pátio e pavilhões serviram de acústica para ecoar o brado de desforra, sufocado na garganta há meses:

— Cachorrão, filho da p…, verme imundo!… “Dedo duro”!

Nunca mais soube do irmão canino.

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