Dar as mãos, não cerrar os punhos – Jayme José de Oliveira

Dar as mãos, não cerrar os punhos - Jayme José de OliveiraO desgaste da política, das siglas tradicionais e a crise econômica cansada de tanta corrupção criaram condições para o surgimento de Bolsonaro,na esteira do vácuo deixado pela descrença nos atores tradicionais. A retórica direta, simplista – quase simplória – foi compreendida pelo eleitor comum, cansado, desiludido do palavreado pomposo que tentava – inutilmente – ocultar o viés do aproveitamento indevido, indecoroso, das verbas que deveriam ser aplicadas no bem estar da população. Por outro lado, investimentos maciços em obras no exterior – porto Mariel, metrô de Caracas, ponte sobre o rio Orinoco, estradas na África, etc., causaram justa revolta.

Dar as mãos, não cerrar os punhos - Jayme José de OliveiraFinanciados a juros ínfimos com dólares captados a juros de mercado, a diferença bancada pelo Brasil. Os pagamentos serão efetuados, SE FOREM HONRADOS PELOS TOMADORES ESTRANGEIROS, com prazos a perder de vista. Brasileiros de bom senso e inconformados com a falta de empreendimentos similares no país inflaram das urnas. O atentado a faca contra Bolsonaro, inicialmente considerado fake por adversários consubstanciou a possibilidade de vitória, sem maiores desgastes pelo não comparecimento a debates. Estes, tradicionalmente favorecem opositores em desvantagem nas pesquisas, sempre usados para “metralhar” quem ponteia.

Redução da maioridade penal para 16 anos; excludente de ilicitude para policiais que matam em confronto com delinquentes; flexibilização do Estatuto do Desarmamento; redução dos benefícios da progressão de penas;penalização severa para as invasões de propriedades rurais ou urbanas, classificando-ascomo atos terroristas e outras alterações na legislação apenas serão factíveis se obedecerem os trâmites democráticos, com alterações na Constituição. Isto representa uma garantia contra arroubos autoritários tão temidos por muitos cidadãos, mesmo que tenham votado no candidato vencedor.

O desafio do PT, na avaliação de analistas, será superar divergências internas e aglutinar o apoio de siglas que, na reta final da disputa se mantiveram longe do palanque de Haddad, como o PDT de Ciro Gomes. Este, inconformado com a rasteira que lhe foi aplicada no 1º turno – Lula o responsável direto – não apenas se abstraiu de auxiliar, viajou para o exterior e em declarações após o retorno deixou patente o ressentimento que persiste e trará profundos reflexos nos próximos pleitos. Os preitos de Haddad para apoio foram sumariamente rejeitados.

O PT sempre foi hábil como oposição, porém, agora, o encanto que irradiava como o partido da ética, da moral e do desenvolvimento foi soterrado pela avalanche da corrupção, desperdício e até mesmo da apropriação indébita, os conhecidos “malfeitos” que, aliás, foram muito mais que simples “malfeitos”. Contudo, mesmo derrotado o PT saiu fortalecido da eleição, considerando o sorvedouro que submergiu outros partidos, principalmente o PSDB. O PMDB ultimamente se caracterizou como o partido do “engajamento” ao vencedor. Suas últimas aparições na disputa foram pífias, vejam-se os votos que Orestes Quércia e Henrique Meirelles conquistaram quando disputantes.
As possibilidades dos partidos derrotados recuperarem posições nos próximos pleitos dependem, fundamentalmente, de Bolsonaro não corresponder aos anseios de seus eleitores e do mercado. E isso a curto prazo.

Para refletir: o panorama político virou um autêntico “samba do crioulo doido”. Compensando parcialmente o imobilismo de possíveis – e desejados – correligionários, adversários ferrenhos apoiaram o PT no 2º turno: Alberto Goldman (ex-governador de São Paulo); Rubens Ricupero (ex-ministro); Jarbas Vasconcelos (senador) que afirmou: jamais votaria em Bolsonaro, não há condições. Viram-se na condição de Odisseu (Ulisses para os romanos) descrita por Homero em “Odisseia”: entre Cila e Caridbis, qualquer decisão apontava mais para um naufrágio que para a chegada a Ítaca, a ilha do Dar as mãos, não cerrar os punhos - Jayme José de Oliveiraporto seguro onde o aguardava, por dez anos, sua esposa Penélope.

Estamos numa situação tão caótica que um único caminho se apresenta para a sobrevivência. Nossa, dos nossos filhos e dos filhos dos nossos filhos, pode ser resumido numa palavra: CONCILIAÇÃO. Em coluna anterior apontei a coragem e desprendimento de Nelson Mandela, África do Sul, ao desconsiderar toda a humilhação e inconformismo com os 26 anos que sofrera no cárcere. Mostrou-se ao mundo como um verdadeiro HOMEM, conciliou negros com brancos e fez ressurgir uma NAÇÃO!

FAÇAMOS O MESMO!

P.S.: Pronunciamentos de Bolsonaro e Haddad após a divulgação do resultado: todos ESCUTARAM as mesmas palavras. Cada qual OUVIU e INTERPRETOU à sua maneira. Por enquanto continua o DISSENSO.

Em ambos os grupos que disputaram no voto a presidência do Brasil há radicais que se consideram “donos da verdade” e são eles que aprofundam a fissura que dividiu os brasileiros de maneira aparentemente incontornável. A eles dedico um pensamento de frei Betto, incontestável partidário das esquerdas no Brasil: “Existem três verdades: a sua, a minha e a verdade verdadeira. Nós dois, juntos, devemos procurar a verdade verdadeira”.

Jayme José de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado

 

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