(e)Ternamente, Maysa…
Sob a direção de Jayme Monjardim, foi exibida pela Rede Globo a minissérie “Maysa, quando fala o coração”.
Até aí, nada de excepcional, não fosse Jayme Monjardim filho de Maysa Figueira Monjardim ou, simplesmente, Maysa. Expor a nu a vida dessa mulher polêmica, atrevida, nervosa e emocional, exigiu de Monjardim excessiva dose de coragem onde, muito mais do que um tributo ao mito, exorcizou as carências resultantes do vazio e da ausência da figura materna durante quase todo o tempo em que Maysa viveu.
A paulista Maysa, filha de tradicional família vinda do Espírito Santo, casara-se aos dezoito anos com o empresário André Matarazzo, dezessete anos mais velho, de cuja união nasceu Jayme Monjardim Matarazzo, que foi criado pela avó e, posteriormente, num colégio interno na Espanha. Separada do marido, que se opusera à carreira musical, e com o temperamento boêmio herdado de seu pai, Maysa teve relacionamentos amorosos com o compositor Ronaldo Bôscoli, o empresário Miguel Azanza, o ator Carlos Alberto, o maestro Julio Medaglia, dentre vários outros.
Solidão, abandono, melancolia, foram os sentimentos que se fizeram presentes em toda existência desse anjo-demônio, dono de olhos de gato, voz de veludo, um meio sorriso e um temperamento pronto para explodir. Isso tudo, aliado à intensa e frenética vida noturna, ao tabagismo e ao alcoolismo, contribuiu para o final trágico num acidente de carro na ponte Rio-Niterói, em 22 de janeiro de 1977.
Sob estas reflexões ora escrevo, ainda sob a comoção causada pela arrebatadora Ne me quites pas, do compositor francês Jacques Brel, na qual a interpretação de Maysa é sublime. Maysa, a odiada, a idolatrada, a banida, a amada é, no entanto, um mito.
Afinal, o que é um mito? Para se conquistar essa condição há de se morrer jovem ainda ou, ao contrário, porque precocemente partiram eles se tornaram mitos? É algo infinitamente transcendental! Janis Joplin afirmou que mil vezes morrer aos vinte anos vividos intensamente, do que serena e pacificamente aos setenta acomodada em cadeira de balanço. Essa galeria é extensa: Edith Piaf, James Dean, Marilyn Monroe, Elvis Presley, Jonh Lennon, Princesa Daiana, Leila Diniz, Elis Regina, Ayrton Senna. Todos, de uma forma ou de outra, não apenas cedo partiram como suas mortes foram trágicas. Marilyn, Leila, ou Maysa fariam parte dessa galeria se, hoje vivas, fossem dóceis e pudicas avózinhas? Imagine seria o hino de paz sem o holocausto de Lennon? Elvis, um empapuçado gordalhão? Senna seria maior do que Schumacher?
Todos eles, em suas solidões, com seus vícios, suas fragilidades e loucuras, por terem sido verdadeiros, abdicaram às máscaras que, certamente, esconderiam o lado obscuro e hipócrita de suas condições de humanos. Aos mitos não se concedem máscaras! Aos mitos não se permitem inverdades!
Se, depois disso tudo, ainda houver quem entenda “Che” Guevara como um deles – não lhe bastasse a despudorada máscara de herói(?) –, então os mitos – os verdadeiros! – legariam à posteridade aforismos de tamanha idiotice, extemporâneos e desconectados da mais elementar lógica como a de que “hay que endurecerse sin perder la ternura jamás”?
Ora, nem mesmo as românticas leitoras de Capricho, Sétimo Céu e de Caras acreditam nisso.