Ficção e não-ficção: uma distância oceânica
O conto se afastou da História com o avanço da imprensa. Tornou-se “folhetim”, inteiramente fictício, sustentado pelas asas da imaginação, ou do que se define como licença poética, e não tinha, como nunca teve, as características da crônica moderna. Era um texto mais longo, publicado geralmente aos domingos no rodapé da primeira página do jornal.
Por sua vez, a crônica, aos poucos, foi se constituindo como um novo gênero literário. Sua linguagem se tornou mais leve, mas com elaboração interna complexa, carregando a força da poesia, do humor, do trágico, e do suspense, ainda que se trate de circunstâncias do cotidiano, da nossa realidade, enfim.
Arthur Conan Doyle (1859-1930), dentre outros, soube com maestria criar o seu folhetim em jornais do Reino Unido, valendo-se da personagem de um detetive, Sherlock Holmes, que viveu em Londres, num apartamento na Baker Street, 221B (hoje um museu), entre os anos de 1881 e 1903, na companhia de seu fiel amigo, Dr. Watson. A personagem ganhou tamanho vigor e transcendeu o seu criador, a ponto de os leitores enviarem cartas àquele endereço agendando entrevista com o objetivo de contratar os serviços profissionais do detetive, ao contrário de minhas personagens, Clara e Miguel, que “ester”veram no Litoralmania durante quatro capítulos e por ali ficaram ou, quando muito, foram “viver” em São Tomé das Letras.
Modernamente, ainda que ficcional, o conto pode – por que não? – ser motivo de experiência e reflexão ou, simplesmente, nos divertir, através da imaginação, para que, em seguida, retomemos a vida como ela de fato é.
Terminada a leitura e confundir o fictício com “realidade subliminar” é, no mínimo, fortalecer neuroses infantis ou, no bom e saudável português, dar demasiada dimensão ao pequeno susto (sem consequências) que o fantasma da dislexia quer pregar.
Agora, sim, de volta à crônica!