Não vai ter copa!
Fui logo tomado de certa nostalgia ao lembrar de minha juventude nos anos 80 e das grandes lutas de minha geração: pelo fim do regime militar, Diretas Já, redemocratização do país, Assembleia Constituinte, eleições presidenciais de 1989, etc, e percebi a abissal diferença entre as nossas manifestações e as atuais.
Em primeiro lugar, constatei que nós não escondíamos o rosto, ao contrário, fazíamos questão de “tomar partido”, de “mostrar a cara”, muitas vezes pintadas de verde e amarelo.
Lutávamos para que o Brasil se tornasse uma verdadeira democracia, com participação popular, partidos políticos representativos e instituições republicanas e fortes: Judiciário independente, parlamento atuante, executivo eficiente e transparente, Ministério Público, Defensoria Pública, OAB, sindicatos e imprensa livres, etc.
De certa forma, todas aquelas aspirações se tornaram realidade. Hoje não podemos negar que vivemos num grande país republicano e democrático e que está gradualmente resgatando suas dívidas históricas com a população empobrecida e excluída.
Fruto daquele grande movimento popular e democrático a Constituição Federal de 1988 inscreveu em seu primeiro artigo: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I- a soberania, II- a cidadania, III- a dignidade da pessoa humana, IV- os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V- o pluralismo político”.
Por sua vez, o art. 5ª da Carta Magna estabelece que: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (…)”. Contudo, como nenhum direito fundamental é absoluto ou ilimitado, o próprio inciso IV, do mesmo artigo, assevera: “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”.
Feita esta pequena digressão histórica, volto ao debate inicial sobre os nossos jovens com o rosto encoberto e já podemos perceber, então, que Estado Democrático de Direito não significa anarquia ou ausência de normas. Ao contrário, aqueles que não assumem o que fazem e que usam de violência em manifestações que deveriam ser pacíficas estão agindo fora da lei, estão transbordando de seu “direito”, e como tal, estão sujeitos à responsabilização jurídica de seus atos impensados e inconsequentes.
Neste ponto, para evitar dúvidas, é preciso deixar claro que sou favorável a toda e qualquer manifestação legítima, tanto as atuais quanto aquelas ocorridas em meados do ano passado, nos quais milhões de brasileiros foram às ruas para demonstrar sua insatisfação com os serviços públicos, em especial o transporte coletivo.
Todavia, preciso registrar duas questões cruciais sobre estes movimentos: primeiro, não concordo que “o gigante tenha acordado” como afirmaram alguns jornais, porque o exercício pleno da cidadania é muito mais do que sair em passeatas convocadas pelo FACEBOOK; segundo, em todas aquelas manifestações houve pancadaria e depredações ao final, portanto, de nada adianta dizer que o movimento era inicialmente pacífico porque sempre pessoas mal-intencionadas acabam dando o seu show de horror e pancadaria.
E o “abuso do direito” foi tamanho que acabou resultando na trágica morte do cinegrafista SANTIAGO ANDRADE, morto enquanto trabalhava, atingido por um rojão solto por “manifestantes” inconsequentes e irresponsáveis, supostamente integrantes dos tais BLACK BLOCS, que segundo se apura, estariam recebendo até R$ 150,00 para participar dessas “democráticas manifestações”.
Percebe-se, tristemente, que estes cidadãos não sabem valorizar o exercício pleno da democracia, conquistada a duras penas pelo povo brasileiro, após vinte anos de uma sombria ditadura que matou mais de 2.000 pessoas e fez “desaparecer” outras centenas de brasileiros, na sua maioria jovens.
Por causa destes anônimos tresloucados certamente o Congresso Nacional vai desengavetar alguns projetos de lei que irão tipificar o crime de terrorismo, proibir o uso de máscaras, endurecer as penas, etc, prejudicando todos aqueles que veem nas manifestações populares uma arena pacífica para o fortalecimento da democracia.
Dizem que a história se repete e parece mesmo que a profecia se autorrealiza: a geração dos anos 60/70/80 (geração X) lutou para democratizar o Brasil, a “geração Y”, em especial os integrantes dos BLACK BLOCS (até o nome é americano) está fazendo de tudo para reimplantar o autoritarismo e a repressão no país.
E para encerrar, respeitosamente deixo um recado àqueles que não querem a realização da copa do mundo. O momento certo para se manifestar era em 2007 quando o Brasil concorreu e ganhou a disputa para a realização do mundial. Agora que o país já gastou bilhões e se comprometeu perante o planeta inteiro seria ridículo desistir. Portanto, apesar dos transtornos, VAI TER COPA SIM!