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Perder amigos

Não desejo mais perder amigos!

O maior prejuízo afetivo que contraí fora o de uma amizade iniciada há 57 anos.

As causas? Discussões sobre o nunca dantes visto débâcle da moral e da ética, resultante do descrédito das instituições públicas, ante a perda daquelas virtuosas referências por parte da grande maioria dos representantes dos poderes Executivo, Legislativo e que, hoje, tristemente, enlameiam o Judiciário em seu órgão máximo.

Estamos se não inimizados, como cordiais desconhecidos em eventos caso nos encontremos.

As redes sociais também muito contribuem para estas cisões. Basta um leve toque de “enviar” e o retorno virá de imediato: raivoso, furibundo, ainda que, muitas vezes, desprovido de razões e de inepta  argumentação.

Por que eles são tão cegos em sua idolatria, em seu amor tresloucado a falsos messias, a líderes embusteiros, mendazes, a timoneiros que, cedo ou tarde farão afundar este imenso Titanic que ainda é o Brasil.

Tacham-me de reacionário, de pertencer à “elite”, quando elite passou a ser o pejorativo de quem com eles não comungue.

Ofendem-me e me agridem com tamanha raiva e desvario que parecem regurgitar espumas de um ódio desproporcional.

O fato de apreciar um abacate batido com leite condensado não me impede de refutá-lo, caso esta fruta esteja podre. Comê-lo, sorrindo, e dizer aos outros que o podre é a melhor sobremesa do mundo? Cegueira mental ou hipocrisia? Escolham!

Continuarei, no entanto, a não concordar com uma só palavra que, desesperadamente, eles buscam nos baús mumificados, retrógrados, encobertos pelas teias de aranha do Tempo para defender, a História o dirá, o que é indefensável.

Afinal, eu tenho também a minha história!

No auge e na ferocidade do regime de exceção – Costa e Silva e Garrastazu Médici – eu finalizava meu Curso Clássico, no Colégio Estadual Júlio de Castilhos. Fechado o Grêmio Estudantil pelas forças da ditadura, fundamos o CAJU (Centro de Atuação Juliana), que se tornou uma célula tão ou mais incisiva do que o era o Grêmio. Muitos eventos foram invadidos à base dos cassetetes da Polícia de Choque (os famosos capacetes vermelhos).

Em 1969, ingresso no Teatro Novo de Porto Alegre, apresentamo-nos nos mais improvisados palcos – Presídio Central, Favela da Maria Degolada – a peça A Fossa, um instigante texto, de autoria de Ronal Radde, que aborda exatamente o tema repressão, desemprego, religião e o sistema de saúde.

A partir das Diretas Já, jamais concedi meu voto a Collor de Mello, Fernando Henrique Cardoso e José Serra. Nas eleições de 2002, sim, foi o meu derradeiro voto a Lula da Silva.

Não obstante, aindo sou o destinatário do arsenal verborrágico do Século XX, como se me fosse vetado o contraditório. Onde está o Estado Democrático de Direito, que tanto alardeiam? Contestam só o lado que lhes contesta? Nunca criticam os desmandos dos seus, apenas as posições de quem com eles não comunga? Não perceberam que a vida vem me dando razão, junto com a minha coerência? Serão maduros o dia em que reconhecerem que, às vezes, se acredita em quem não devia e que as diferenças podem ser tratadas sem grosserias. Ser rebelde é defender partidos e políticos podres??? Rebelde é quem contesta todos os malfeitos . O que sempre venho fazendo.

Em conclusão, não são apenas chatos; são divertidos e, ao mesmo tempo, cansativos, pois a ladainha de quem sempre vem com a mesma cantilena vira piada.

Por isso, ao escrever meus textos, nunca o direciono especificamente a este ou quele leitor minhas reflexões. Mas garanto que tenho mais a favor do que contra.

Contestadores fomos nós – o elenco do Grupo de Teatro Novo Porto Alegre – que fugíamos após os debates pela porta dos fundos dos locais onde apresentávamos A Fossa, que mostrava a disparidade, há 40 anos atrás, entre os ricos e os pobres. Já falávamos do traficante, que explorava as prostitutas, a falta de atendimento nos hospitais que o retirante Pedro percorreu até a morte da filha que nunca viu um médico na sua frente e em pleno velório, com a presença do padre fazendo a encomendação do corpo, se discutiu a posição da Igreja frente o abandono dos pobres, do analfabetismo, do desemprego, da injustiça quando o protagonista foi preso por roubar uma boneca para a filha morta.

Isso, sim, é rebeldia.

A situação não mudou; só é manipulada por quem esperávamos que um dia viesse para mudar, não para se beneficiar no poder. Mas estamos vivos e a luta continua. O que vale são as pessoas que somos, fomos e continuaremos a ser. E sem perdermos os bons e verdadeiros amigos!

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