Sábado também é dia de chope
Hoje é sábado, onze da noite. Olho a cidade pela janela do bar, tendo a solidão por parceira de copo. Clamo – por telepatia – por socorro. Socorro para o amigo de trago e de sempre; socorro para a amada que um dia se foi; socorro para o companheiro de futebol, ainda que seja para apostar quem vai vencer o próximo Gre-Nal; socorro, até mesmo, p’rá prostituta que passa na calçada e põe-me a língua, lasciva. Mas, qual! Aonde e como se encontram? Afogados noutro cálice do qual eu não possa compartilhar?
Amando com outro sobre areias brancas e ardentes de uma praia deserta na inútil tentativa de me esquecer? Torcendo, clamando por jogadas monumentais num estádio quase vazio? – o porteiro, desatinado, ansiando trancar os portões, apagar os refletores e ir-se embora, pois lhe espera a mulher, sôfrega de paixão, para entregar-se e amar até as últimas conseqüências. A meretriz, sem açúcar e com nenhum afeto, retorna ao barraco p’rá fazer o doce predileto do malandro que não tem hora p’rá voltar. A mim, só me resta o copo vazio.
Nalgum lugar deve estar acontecendo uma festa. Em qualquer esquina alguém deve estar perguntando as horas ou a previsão do tempo. E há um outro para lhe dizer que as estrelas brilham no firmamento e que a noite inda é criança.
Vem-me o desejo irreprimível de falar mentiras, de contar estórias, de dizer que sou inteligente, viajor, poeta e cantante. De lembrar que um dia houve um encontro. Ali, por vez primeira, alguém me disse que eu tinha medo da entrega. O encontro único, cunhado em indeléveis lembranças da mulher que descobriu o homem que, tardiamente, soube do amor e que, nesta noite tão vazia, reduz a janela do bar em algo inteiramente inócuo no seu objetivo de avistar esse pedaço da aldeia.
Peço ao garçom que traga outro chope. O copo, antes vazio, está vívido pelo líquido ornado de ouro.
O eterno recomeçar: reaprender a falar, dizer coisas como “que horas são?”, “como é o seu nome”, detesto “suchi”, “adoro um chope com bolinho de batatas do Chula’s”. “Eu preciso de você”.