Uma criança no carro
O esquecimento de crianças pequenas, dentro de carros, acontece com mais frequência do que se imagina. É um fato que resulta, sempre, em uma tragédia. Lamenta-se uma vida que, no nascedouro se extingue e lamenta-se uma vida que continua, daqui para a frente, sob um drama de tamanho incomensurável. Sim, pois quem poderá aliviar as dores deste pai ante ao fato de ter produzido, por negligencia, a morte de sua filha e quem poderá mensurar o seu nível de culpa quando olhar para a mãe de sua filha e, silenciosamente, admitir que ele produziu uma morte que dilacerou sua família.
Quem poderá aliviar sua dores, quem poderá diminuir sua culpa, quem terá a palavra correta e na medida para levar-lhe o consolo de que, agora, ele tanto precisa? A que tormentos solitários este pobre homem se acometerá, que condenações pessoais este pobre homem se infligirá? Que angústias intermináveis abrasarão seu coração e sua mente, no decorrer da sua vida futura? Ninguém pode avaliar suas dores e ninguém poderá lhe levar o remédio para curá-las.
Resta-lhe, agora, na condição de pai e de homem, que se sobrepõe a tragédia, reconstruir sua história e a história de seu relacionamento familiar e sobre os escombros da dor, da culpa e da angustia que esta tragédia lhe trouxe, tentar recomeçar a costurar sua vida e a vida de seus afetos.
Talvez consiga, talvez não. Vamos acreditar que consiga.