Voar perdeu o seu charme

A primeira ida ao aeroporto foi para as despedidas de parente em terceiro grau de minha mãe. Sim, parente em terceiro grau! Além de nós – meu avô, meus pais – lá estavam, em alegre bando, os filhos, genros, noras e netos da tal parente. Afinal, nos anos 50, viajar a Buenos Aires, a bordo do Super Consttelation da Varig, não era pouca coisa.

Aos viajantes o terno e gravata, o tailleur, luvas e chapéu compunham o bom tom, a elegância que o voar ensejava.

As viagens aéreas, com o tempo, democratizaram-se; via de consequência, se não se aboliram totalmente as gravatas, o guarda-roupa se tornou mais prático e despojado, sem, contudo, perder a discreta elegância.

O governo Lula da Silva, confundindo assistencialismo com socialização, foi pródigo na distribuição indiscriminada da bolsa-família-bolsa-presídio-vale-leite-vale-gás-vale-cachaça-vale-tudo e toda a sorte de vales e bolsas.

Via de consequência, todas as ruas das cidades brasileiras foram invadidas por automóveis Modelos 1.0, com bônus de IPVA pago, IPI reduzido, taxa zero, pagamento em setenta parcelas mensais, “fruto sobrante” das benesses e da conjugação das “bolsas” do ex-presidente da Silva.

Seria louvável, não fosse a incapacidade, sobretudo das grandes capitais, de suportar tamanho fluxo de veículos. Resultado: o trânsito caótico verificado, não apenas na hora do “pico”, em São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Natal, Porto Alegre. Para se ter uma mínima ideia, Fortaleza “acomoda” em suas ruas mais de 66.000 motocicletas.

A indústria do turismo não poderia ficar atrás. Pacotes de curta duração (finais de semana e eventuais feriadões) a preços acessíveis, passagem aérea para os mais variados destinos sem entrada, com  prestações a perder de vista, motivaram, com justiça, o sonho de consumo do emergente das bolsas assistencialistas que, até então, jamais imaginaria tal ventura.

A exemplo da conquista do primeiro carro, a possibilidade a todas as classes sociais de voar seria igualmente louvável, não fosse a precariedade dos aeroportos (ver matéria de ZH desta quinta-feira, 3), exceção, talvez, aos de Guarulhos e do Rio de Janeiro.

O check in extremamente demorado e informações equivocadas dos portões de embarque (em Brasília e Fortaleza é caso de polícia!), sanitários e instalações em estado de limpeza e conservação pior do que muita rodoviária do interior (e ambas sediarão jogos da Copa 2014).

No particular – permissividade do acesso de passageiros de higiene duvidosa ou portadores de doenças virais, sobretudo em aeroportos nordestinos, a ANAC faz flagrante vista grossa. Esses brasileiros só não trazem consigo o bode a cabresto e a galinha sob os braços por falta de espaço nas aeronaves.

Fui testemunha do constrangimento de um passageiro ao ter como vizinho de poltrona uma senhora, do interior do Ceará, vítima de tuberculose e que viajava sem os mínimos cuidados. Ele exigiu das displicentes comissárias (TAM) que fornecessem à doente uma máscara descartável.

É aí que bate uma tristeza imensa pela saudade deixada pelas aveludadas e pausadas vozes (como a da atriz Sandra Barsotti) nos autofalantes dos aeroportos do Brasil anunciando com elegância as chegadas e partidas e da nossa glamourosa VARIG, covardemente assassinada pelos escusos interesses de um governo flagrantemente assistencialista.

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