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A confraria de cada um

A confraria de cada um
“Foi chegando sorrateira
E antes que eu dissesse não,
Se instalou feito posseira…”
“Teresinha” – Chico Biarque

A expressão confraria, ainda guarda o seu significado original: associação religiosa ou de caridade. Irmandade. Modernamente, ele faz menção muito mais a conjunto de pessoas que se associam tendo em vista interesses e objetivos comuns.

É comum, sobretudo nas grandes cidades, notar-se, aos finais das tardes das sextas-feiras, após a extenuante semana de trabalho, colegas reunirem-se às mesas de bares ou pubs para o descontraído bate-papo, regado com canapés, chopes, vinhos ou destilados. A conversa, ali – no já consagrado répiau –, corre solta, livre, desenfreada. Afinal, este é o espírito da confraternização. O grupo que ali se reúne para libação e celebração da vida trata-se, sim, de uma confraria. A confraria é, por extensão, o reduto aonde –  respeitados os limites da civilidade – reinam soberanos a mais plena democracia e a livre expressão do pensamento. O lema não poderia jamais ser outro senão a célebre sentença atribuída a Voltaire: “Não concordo com uma só palavra do que dizes, mas defenderei até a morte o vosso direito de dizê-lo”. Nelson Rodrigues, por outro lado, certamente seria o patrono de todas elas quando avisa que “Toda a unanimidade é burra”! E está o nosso “Anjo Pornográfico” coberto de razão. Não poderia haver coisa mais enfadonha se todos rezassem pela mesma cartilha.

Integro, atualmente, duas confrarias: a primeira, literária, que reúne, mensalmente, escritores, escritoras, poetas e poetisas que compõem a Academia dos Escritores do Litoral Norte. A segunda – autêntico “Clube do Bolinha”, por que não? –, um seleto grupo de amigos (quantidade é o que menos nos importa!), em que escolhemos as quartas-feiras para os nossos encontros.
As discussões, os debates, o contraditório é o princípio vital da sobrevivência do grupo, aliados ao mundano prazer da mesa, da libação dos bons vinhos e cervejas. É o momento destinado para fumar um bom charuto, para discutir sobre o time de futebol para o qual se torce, para sonhar com Gisele Bündchen, Angelina Jolie, Michelle Pfeiffer, Cameron Diaz, Sharon Stone e a imortal Marilyn Monroe, mulheres que coabitam o nosso imaginário e o universo de beldades. É a ocasião até mesmo para jogos, como o “Caça ao Político Honesto” (morto não vale!), cujo vencedor é o participante que apontar um nome em menor tempo. O placar, infelizmente, ainda está fechado.

A confraria, por sua própria natureza e princípios, não pode admitir nas suas reuniões – não apenas a inoportuna presença de quem é “estranha no ninho” – sua intromissão nos assuntos dos convivas, o que, por via de consequência, inibe a descontração e o estar à vontade, indo, assim, de encontro  ao objetivo e à clausula pétrea de qualquer confraria, o derradeiro reduto de liberdade e de expressão do que se pensa!

Assim, é preferível, então, que ela não mais aconteça. Estamos entendidos?

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