Da série A Praça Júlio de Castilhos e a Turma do Murinho - Litoralmania ®
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Da série A Praça Júlio de Castilhos e a Turma do Murinho

Para Breno Wiethölter

Como vai o “Seu” João?

Em locais ou situações inesperadas — lojas, festas, elevadores —, bastava aparecer uma figura bizarra, ar ingênuo, principalmente senhoras, que era escolhida como vítima pelo Breno. Puxava assunto sem nunca tê-la visto:

— Ora que prazer! Quanto tempo! Como vai a senhora?

A mulher, ar interrogativo, respondia:

— O senhor me conhece?

O Breno com a resposta pronta cortava o assunto, não permitindo dar tempo da mulher muito indagar:

— A senhora não é conhecida ou amiga do “Seu” João?

— Sim, mas como me conhece?

— É que eu sou amigo do sobrinho do “Seu” João, o Normélio, lembra? Aliás, da última vez que o vi, ele me disse que a senhora estava com problema sério de corrimento e comichão. Melhorou?

— Nunca tive problema de comichão e corrimento, de onde o senhor buscou tamanho disparate?

— De qualquer forma — continuava o Breno, sem dar ouvidos à indagação da mulher — há que ter cuidado. — E, virando as costas, se ia embora, deixando a vítima falando sozinha e ar interrogativo da situação vivenciada.

E justificava: “Quem não conhece um João na vida?”. É perguntar e seguir a conversa…

Por vezes, deixava o companheiro embaraçado. De surpresa, alertava ao incauto, puxando-o para perto do amigo:

— Olha quem está comigo, o Poester! — (ou Guto, ou Zabanetta, ou Negrão, ou Dullius), que ficavam, tanto quanto amolados, como surpresos e envergonhados.

Matoso no fundo da sala

Certa vez, ao caminhar na companhia do Alírio  no corredor de um andar do Edifício SULACAP, de repente, Breno indagou o amigo:

— Escuta, tu conheces o Matoso?

Alírio , para não levar a conversa adiante, querendo encerrar o assunto, de pronto, respondeu:

— Conheço.

No mesmo instante, Breno abriu a porta de uma sala e, sentado atrás de uma mesa, no fundo do ambiente, estava um indivíduo nunca visto pelo Alírio . A recíproca era verdadeira. Breno dirige-se ao homem:

— Matoso, olha quem eu trouxe para te dar um abraço: o Alírio!

Matoso, que conhecia Breno, não perdeu o humor:

— Um abraço, Alírio . E quanto a ti, Breno, vai pra pqp…!

O amigo caíra em mais uma do Breno.

O casal e a boate

Breno cruzava às vezes por um casal desconhecido e indagava, parando o homem:

— Quanto tempo, como vais?

Constrangido, mas educado, buscando reconhecer o interlocutor, o homem respondia:

— Bem!

— Quando vais aparecer novamente?

O homem curioso, indagava:

— Aparecer, aonde?

— Ué, na boate… A Vanessa, está maravilhosa, anda com saudades… Aproveita e vai lá amanhã; tem strip-tease…

Dava as costas e deixava o homem a se explicar à mulher…

* * *

Breno tocou um negócio no Amazonas, como empresário e madeireiro. Sua vida era ir-e-vir do Sul ao Norte. Passava longas temporadas no Mato Grosso, Acre e Rondônia. Quando voltava a Porto Alegre, era dele a iniciativa de reunir os amigos da Praça Júlio, quase sempre na Churrascaria Santo Antônio.

Em certo encontro, casualmente, apareceu na churrascaria, na companhia de amigos, o ator Paulo Gracindo, em temporada na cidade. Breno armou a estratégia: “Vamos deixar servi-lo; quando ele começar a comer, um por um, vai ao Gracindo pedir o autógrafo”.

Logo que o ator preparava-se para degustar o suculento filé recém servido, começou, a intervalos, a romaria de autógrafos. Na mesa da turma eram em torno dez. Logo os outros fregueses perceberam a movimentação aderiam à “sessão“ de autógrafos. Em certo momento, os garçons imploravam: “Deixa o homem comer. Depois vocês vêm a ele”. Mas isso de nada adiantou.

Coitado do Gracindo! Em que local havia se metido! Formou-se considerável fila, junto à mesa do ator, enquanto o seu filé, no prato, esfriava. Praticamente todos os clientes do restaurante aderiram à súplica do autógrafo.

Contraponto

Quem se expõe acaba suscetível de sofrer o revés; a luz do holofote mostra as feridas…

Breno, antes de deixar Porto Alegre, trabalhou numa financeira de automóveis. A constante visita às revendas e a rapidez por parte de seus funcionários eram condições para o faturamento ansiado pelo sôfrego banqueiro. Recém surgido, a solução para facilitar o trabalho do Breno foi muni-lo com um “Bip”. Estava decretado o seu purgatório.

Durante muito tempo, ao longo da jornada de trabalho, ligavam para a Central do “Bip”. Nessas ligações era informado o código do Breno e solicitado para que ele respondesse aos chamados, por exemplo, do “Pedro”, do “Miguel”, do “Doutor Breno”, do “Jesus”. Na realidade, eram deixados os números, previamente verificados na lista dos telefones da residência do Senador Pedro Simon, do Cemitério São Miguel e Almas, do Correio do Povo, da Cúria Metropolitana e assim por diante…
Atordoado, Breno — não lhe restava alternativa — respondia às ligações, deparando-se, então, com o inusitado. Nunca soube quem criara a pilhéria; o autor sempre silenciou.

Breno jamais perdeu o ar brincalhão. No mês de março de 2000, de forma repentina, como se aplicasse uma nova peça aos amigos, partiu para sempre.

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