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Delalves Costa, um poeta a afrontar a enfinge

Coisas que faltam em mim

Faltam ruas, sobro em disfarces.
Eu sei. – Infindáveis
são caminhos a seguir.

Mas… disfarçando vou sem pressa
para não sentir em minhas ausências
– as coisas que faltam em mim.

Delalves Costa
Livro Considerações Pre-maturas & Outras ausências.

Resenha comentada – Luis Nicanor

Osório está de parabéns. Cada dia nos surpreende com o seu crescimento em valores culturais, principalmente na literatura.

Temos muitos nomes de peso a destacar, mas, na oportunidade, não podemos esquecer a surpresa e o alumbramento causado pela leitura da obra do jovem poeta Delalves Costa: Considerações pré-maturas & outras ausências, pela Ed. Ponto, do ativista cultural João Clauveci Murici, que é o autor da capa e das ilustrações do livro, ilustrações à moda cubista ou vanguardista, emprestando outros significados a um simples desenho.  Clauveci, além de literato, desenhista, tirista, é editor do consagrado Jornal de Artes, que não deve nada a nenhuma publicação do gênero.

Já conhecíamos o talento de Delalves com seu livro anterior O Menino dos Cataventos na Rua dos Passatempos e na Antologia 16 Poemas de Amor por Osório.

Cabe um comentário a título tão instigante e feliz como o de seu último livro, dentro do que declara a 4ª capa, como citaremos adiante: o enigma inconcluso:

Considerações pré-maturas; o substantivo consideração, ou seja, raciocínio, reflexão, opinião, proposição, observação, – seguida de um adjetivo cortado por hífen, à maneira concretista, – que amadureceu antes do tempo próprio, precoce, temporão… Estaria o autor referindo que foi obrigado a lançar ao papel suas criações poéticas antecipadas? Ou pode indicar que estas reflexões germinaram em sua mente antes do final da gestação, sem esperar o termo, chegaram antes do tempo, pois o pre (que declara precedência, que vem antes, antecipadamente, com preferência) é seguido por hífen, e logo temos o maturo (maturas), adjetivo antigo que significa maduro; portanto a sua opinião veio prematura, gerou um prematuro, e temos, portanto, um substantivo concreto. E o título segue com a conjunção e (&) como aditivo separando a frase outras ausências (a não existência, a falta ou carência de alguma coisa).

Então o autor declara que foi levado a tecer considerações que amadureceram antes do tempo, juntamente com todo o enigma do infinito que nos cerca, com uma conotação de abstrato.
Na apresentação, Teresinha Marques já declara: “É que o poeta não se realiza nunca. (…) Há uma poética do não acabamento. Incansável procura drummondiana”.

César Mariné, na orelha do livro, esclarece: “Diz-se das coisas que nascem antes do seu tempo que são prematuras. É tudo uma questão de perspectiva. (…) Nesse sentido inquieta-me o título (…) – aliás, inquietude é mesmo uma das funções da poesia, dentre outras tantas.”(…)

Sempre, nas minhas leituras de críticas literárias em suplementos culturais, principalmente, percebia dois detalhes que me causavam certo desagrado: ou o crítico atinha-se em excesso nos erros da obra resenhada, ou, ao invés disso, emprestava méritos que frustrava o leitor após a leitura do livro criticado, pois havia um evidente exagero.

Por questão de ética, infelizmente não podemos elucidar a citação acima com exemplos.

Já não é o caso do nosso Poeta Delalves, que desde o título do livro, como já comentamos, comprova o texto da 4ª capa, onde declara que o autor de agora em diante deverá ousar como tendência o enigma inconcluso.

Considerações Pré-Maturas & Outras Ausências é daqueles poucos livros que não permite ao leitor bocejar ou se distrair com outros pensamentos durante a leitura, como sói acontecer com muitos autores que lemos.

Lido o título do poema, desde o primeiro verso o leitor já se sente obrigado a estar em estado de alerta, pressuroso pelas surpresas que o autor com muita maestria e talento preparou, o que demonstra uma obra trabalhada e de quem maneja a palavra com familiaridade e competência, sem embaralhar-se nos meandros das sutilezas.

Delalves deixa clara a inocuidade da discussão se apenas um poeta inspirado resolve a arte poética ou, além disso, é necessária a eterna busca da técnica para bem executar o poema.  Óbvio que Delalves é um poeta inspirado, mas que não negligencia o preparo com a técnica da arte poética. Cabe aqui lembrar Lorca que dizia que a inspiração traz a imagem, mas não traz a roupagem.

Delalves leva a sério o que preconiza Roman Jakobson, o mestre da lingüística, como sabemos. Para o lingüista a transmissão de uma mensagem pressupõe o remetente, que é o emissor, e o destinatário, que é o receptor. A função do emissor é emotiva e a do receptor conativa ou apelativa, ou seja, a linguagem tem o objetivo de influenciar o receptor. E assim como a ênfase mais comum do contato entre as pessoas se chama fática, o contrário, quando se pretende ênfase máxima na mensagem, é a função poética.

Este talvez longo exórdio seja para deixar claro que a poesia, como sabemos, tem muito de sugestivo e joga muito com os acidentes semânticos; e Delalves, com seus enigmas inconclusos, pega a mão do leitor e o leva a passear em diversas ramagens do intelecto, fazendo-o mesmo até sentir-se à beira de um abismo, com imagens distantes, exigindo-o a ajustar o foco.

Não esquecendo que a linguagem poética, ao contrário da linguagem cotidiana que é transparente, vale-se da opacidade, é desautomatizada (consciente, voluntária) escondendo o verdadeiro conceito do leitor, gerando uma sensação, uma percepção que é a finalidade do poema.

Uma obra como Considerações Pre-Maturas & Outras Ausências merecia uma análise poema a poema, mas o que não seria uma atitude muito correta, porque tiraria do leitor o prazer de ser atingido pela influência poética do autor.

Luis Nicanor é Escritor, Poeta. Médico Sanitarista.

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